Ao ouvir esta frase a ser pronunciada pela Bernadette/Katy Baker do filme "Clube de Leitura Jane Austen" dei por mim a pensar na sua veracidade. A frase surge enquanto ela conversava com Daniel/Jimmy Smits (ex-marido de Sylvia/Amy Brenneman) sobre o livro "Persuasão". Fiquei a pensar em toda a extensão desta afirmação. Talvez ela apenas estivesse a referir-se às cartas de amor. Contudo, podemos expandir o seu alcance e entender que uma carta bem escrita realmente tem muito poder de acção: diminui distâncias, atenua saudades, aproxima famílias e amizades. A letra manuscrita, o papel escolhido e o conteúdo da mensagem, conferem um significado e um valor sem preço ao recebimento de uma carta. Talvez porque em algumas situações consigamos expor melhor os nossos sentimentos e pensamentos através da escrita. Se excluirmos a hipótesde da carta ser portadora de uma má notícia, ela fará alguém em algum lado sorrir.
A carta, na época de Jane Austen (e provavelmente até ao séc. XX) era a forma fundamental de comunicação entre as pessoas separadas pela distância. Desta forma, é natural encontrarmos em abundância referências à escrita, ao envio e ao recebimento de missivas. Na obra de Jane Austen, encontramos muitos personagens a protagonizarem a escrita de cartas; algumas delas fundamentais para o rumo da própria trama. Homens e mulheres surgem a escreverem cartas, mas a verdade é que a liderança parece ser masculina. O que quer dizer que Jane Austen colocou com maior frequência os seus heróis a escreverem cartas. Acho interessante a exclamação de Bernadette, em um dos encontros do Clube de Leitura, sobre este facto; ela diz: "Eu gosto da forma como Austen faz com que os homens se expliquem a si próprios". Assim é. Se repararmos bem, a voz dos heróis não são muito audíveis na sua obra. Vemos o que dizem, os seus gestos e acções; mas raramente aquilo que realmente pensam e sentem. A história parte sempre da voz da heroína. Por isso, é interessante ver os homens exporem-se através das cartas. Por vezes, questiono-me se Jane Austen terá feito assim porque ela própria gostaria que os homens escrevessem cartas com o mesmo nível que ela as imaginava ou se realmente assim usualmente acontecia. Será que os homens expunham tanto assim os seus sentimentos? Será que podemos abraçar a afirmação de Bernadette e acreditar que os homens do tempo de Jane Austen desciam do seu orgulho e da sua posição privilegiada para explicarem-se, sentimentos e pensamentos? Talvez não fossem a maioria. Provavelmente escreveriam cartas, já que era algo usual na sociedade letrada, mas talvez fossem poucos os que o fizessem para revelar afecto.
Eu acredito que, ainda hoje, há "Wentworths", "Darcys", "Tilneys" que se expõem e que são capazes de amar através de linhas e de entrelinhas. Eles andam por aí...tenho certeza.
Guardo comigo a frase de Bernadette e acredito profundamente nela: nunca devemos subestimar o poder de uma carta bem escrita. É um formidável combustível para a alma.
Não se trata de uma obra-prima e, muito menos, chamará a atenção de muitas pessoas. Possivelmente é e será visto como mais um filme cor-de-rosa. Reconheço que não é um filme artisticamente fascinante e até poderia ser melhor em muitos aspectos. Porém, para mim, é um filme muito especial.
A primeira vez que assisti ao "Clube de Leitura Jane Austen" eu ainda não tinha lido a "Abadia de Northanger" nem "MansfieldPark" [ como eu já referi algumas vezes estes dois livros foram muito difíceis de encontrar o que derivou numa tardia leitura ] o que fez com que eu não apreendesse totalmente a dimensão do significados de muitas falas do filme. Mas, desde o primeiro momento, eu senti um grande amor por ele. Depois de ter lido a obra completa, o filme começou a fazer maior sentido. Revejo-o várias vezes.
Resumidamente - para quem não assistiu - o filme aborda a história de seis pessoas que se uniram para fazer a leitura dos seis livros de JaneAusten. Cada um escolheu um livro específico para liderar a discussão. É interessante a forma como a personalidade de cada um mostra-se ser semelhante à heroína/herói de cada livro de JaneAusten. Em inúmeras ocasiões determinados episódios e problemas da vida dos personagens assemelham-se às questões de fundo relatadas nos livros da nossa querida escritora. Eu adoro este aspecto do filme. Esta característica demonstra e justifica bem o facto de JaneAusten ser tão popular nos dias de hoje: porque identificamo-nos com as questões levantadas por ela.
Todos os personagens são fascinantes, mas realmente eu tenho de dizer que tenho uma grande simpatia por Griggs e por Prudie. Griggs (HughDancy) é único homem do Clube e ficou encarregue de ser o anfitrião da discussão do livro "Abadia de Northanger". O interessante nele é reconhecermos nele um misto de Catherine e de Mr. Tilney. Ele tem uma ingenuidade e uma pureza que nos leva a lembrar de Catherine; mas, por outro lado, tem um senso de humor aguçado como o de Mr. Tilney. Parece-me, contudo, que prevalece mais o "lado Catherine": ingenuidade, imaginação, criatividade, fascínio pelo fantástico. Já Prudie (EmilyBlunt) revela-se um ser em angústia. Alguém que está à beira do abismo e não sabe que caminho tomar. Confesso-me fraquejar diante de seres em angústia. Não que o sofrimento seja bom e admirável, mas a capacidade de resistência dentro de angústia conquista-me desde o primeiro momento.
Há momentos divertidíssimos e há momentos em que ouvimos frases absolutamente perfeitas. Bernadette é, sem dúvida, a protagonista das melhores frases. Nunca me esqueci quando ela setencia "Ourworldisanenglishvillage" que era como quem dizia "que mundo tão pequeno". Estamos misteriosamente interligados uns aos outros. Penso em nós (integrantes deste blogue, leitores/as, amigas do Clube de Leitura JaneAusten, futuras integrantes do Grupo de Leitura aqui do blogue) amantes e apreciadores de JaneAusten e no elo que nos liga. Há este vácuo do tempo, da distância, do anonimato, da vida privada de cada um que distancia-nos; mas, há este amor por Jane Austen que nos aproxima. O mês passado, de partilha das nossas preferências da obra e filmes inspirados em Jane Austen é prova disto. Isto é uma aliança que existe entre nós e nem nos damos conta disso. Esta teoria pode ser algo romântico de minha parte. Certo é que acredito nisto. Esta frase tem uma forma metafórica. O nosso mundo é assim: parece tão grande e tão distante mas é, ao mesmo tempo, da dimensão do nosso pequeno universo. Podemos estar próximos ou distantes, a variante é a dimensão do nosso olhar e a vontade de querermos enxergar e partilhar.
Não sabia da sua existência, mas foi uma feliz coincidência encontrá-lo. Qualquer amante de Jane Austen vai adorá-lo, vai compreendê-lo totalmente, vai rever-se nele e vai emocionar-se com ele. Por favor, vejam este filme!
O mote do filme é: Seis pessoas e os seis romances de Jane Austen. Cada uma responsabiliza-se por um, e cada mês lêem uma das obras, juntando-se no final em casa do responsável pela obra para o discutir.
Jocelyn (Emma), Prudie (Persuasão), Bernadette (OP), Sylvia (Parque Mansfield), Allegra (SS) e Grigg (Abadia Northanger) são as seis personagens, o último é a única figura masculina no grupo. Muitas das questões levantadas pelas personagens sobre as obras, são questões que nós próprias fazemos e é interessante os pontos de vista que nos são apresentados. Paralelamente, decorre a história da vida pessoal destas personagens que, curiosamente, são idênticas àquelas de quem elas se ocupam na obra de Austen.
O fim é muito engraçado... não percam este filme. Eu gostei especialmente de Jocelyn e Prudie...