No post relativo ao mês de Julho, indiquei o filme "O véu pintado". Um excelente filme que já tinha sido indicado no mês anterior. Só podemos concluir que o filme é mesmo bom, uma vez que é sugerido por duas pessoas.
Assim, e por forma a colmatar esta repetição, deixo, em substituição daquela, a sugestão do filme "Finding Forrester". Não é um filme brilhante, mas tem dois desempenhos bons, entre eles o de Rob Brown, um actor revelação que interpreta o jovem Jamal, e uma bonita banda sonora.
Jamal (Rob Brown) é um jovem de 16 anos que vive nos subúrbios do Bronx. Apaixonado pela literatura, tenta, a todo o custo, esconder este seu fascínio pelas letras. Escreve em caderninhos às escondidas dos amigos e da família. Por uma questão de aceitação, faz de propósito para ser um aluno médio, com notas suficientes apenas para passar. No basquetebol, é, ao contrário, uma estrela.
Um desafio dos amigos que se vê obrigado a aceitar leva-o a casa de William Forrester (Sean Connery), um escritor refugiado do mundo no ... Bronx! William surpreende Jamal que, com o susto, foge deixando para trás a sua mochila. Mais tarde William vê Jamal no campo de basquetebol, em frente à sua casa, como que a tomar coragem para voltar a subir com o objectivo de recuperar a sua mochila agora pendurada, em forma de estandarte, na janela do escritor. William resolve atirá-la. E, para espanto de Jamal, os seus caderninhos estão todos revestidos de notas feitas pelo próprio Wiliiam Forrester. Jamal ganha, então, coragem para pedir conselhos a William sobre a sua escrita.
William enceta uma viagem com Jamal pelo mundo das letras e da amizade. William ensina Jamal a encontrar o seu caminho na vida através da literatura e Jamal ajuda William a encontrar novamente uma razão para viver.
É uma história linda sobre um jovem talento preso no Bronx e um escritor prisioneiro dos seus receios e estigmas. Uma lição de que a amizade não escolhe idades nem condições sociais.
No post relativo às sugestões do mês Julho falta mencionar um blogue. Existem muitos que gostaria de aqui recomendar. Contudo, a escolhe só poderá recair sobre um. E eu aconselho, este mês, que vejam o "Economia cá de Casa" porque é um blogue virado para a poupança doméstica. Ora, para aqueles que todos os meses se debatem com a gerência de um orçamento que, a maior parte das vezes, não é o ideal devido às circunstâncias actuais, este blogue surge como uma lufada de ar fresco para nos ajudar nesta empresa difícil. É certo que fujo a todas as inclinações de literatura, mas é também verdade que para termos livros e internet, precisamos de uma ferramenta fundamental: o mealheiro. Aqui descobrirão ideias engraçadas, úteis e, sobretudo, económicas.
A minha sugestão de música recai sobre Stacey Kent , uma cantora de jazz americana que estudou literatura em Nova Iorque, no Sarah Lawrence College, tendo depois decidido ir viver para Oxford para aprender línguas europeias (francês, italiano e alemão). É aqui que conhece o saxofonista Jim Tomlinson que se tornará seu marido e que a revelará ao mundo.
Stacey Kent tem uma voz doce, leve, capaz de criar um ambiente calmo e prazenteiro até mesmo para aqueles que admitem não apreciar jazz. É uma voz que se ouve em qualquer altura.
O seu primeiro trabalho surge em 1997. Em 2000 e em 2001 ganha o prémio de melhor vocalista de jazz. É também em 2000 que sai um dos seus melhores trabalhos, Let yourself go: Celebrating Fred Astaire. Um disco fenomenal, harmonioso e envolvente. Em 2006 assina um contrato com a Blue Note. Em 2009 edita Breakfast on the mornig tram, já incluindo trabalhos originais.
O seu último trabalho Racconte-moi, editado em 2010, é todo cantado em francês. Um trabalho lindo, igualmente envolvente e marcante que se tornou um dos trabalhos de língua francesa mais vendidos no mundo. Isso valeu-lhe o prémio Chevalier dans Lórdre des Arts et des Lettres.
FILME
O Véu Pintado é um romance de W. Somerset Maugham, que a ASA reeditou este ano, adaptado para o cinema em 2007, com Naomi Watts e Edward Norton nos principais papéis e dirigido por John Curran, com uma lindíssima banda sonora de Alexandre Desplat, interpretada ao piano por Lang Lang, sendo que a fotografia ficou a cargo de Stuart Dryburgh.
Trata-se de um história de amor passada nos anos 20 que nos conta a história de um jovem casal britânico, Walter, um médico da classe média e Kitty, uma mulher da alta sociedade, que casam pelas razões erradas e se mudam para Xangai, onde ela se apaixona por um outro homem. Quando Walter descobre que a mulher lhe é infiel, aceita num acto de vingança um lugar numa aldeia remota da China, desvastada por uma mortífera epidemia, e leva-a consigo. A sua viagem traz um novo significado à sua relação e à sua essência, num dos mais belos e remotos lugares ao cimo da Terra.
Um filme brilhante (com duas interpretações igualmente brilhantes) sobre o encontro de duas pessoas que, estando juntas, viajavam pela vida em sentidos opostos.
LIVRO
Tempo de Fogo é o primeiro romance de Amadeu Ferreira, autor ligado à língua mirandesa, com vários livros publicados nesta segunda língua de Portugal. É baseado em factos reais retirados dos arquivos do Tribunal da Inquisição e cuja acção decorre, essencialmente, num período da nossa história que, como diz o autor, ainda nos dias de hoje marca o povo português. É um livro cru, à semelhança daquele tempo duro, frio e asfixiante, mas simultaneamente profundo. Com uma escrita naturalmente simples e autêntica, o autor leva-nos para uma viagem carregada de realismo que se centra nos últimos dias de um frade condenando por aquele Tribunal. Uma leitura empolgante. Fez-me lembrar "O nome da Rosa", talvez por causa da figura do frade e de todo o peso daquele período histórico. É impossível ficar indiferente a esta história.
Eis o resumo: um frade homossexual é queimado às ordens do Tribunal da Inquisição, condenado por breves amores de juventude na universitária Salamanca dos fins do século XVI. Através de personagens reais, perseguidos pela Inquisição, é passado em revista o ambiente sufocante do país nos anos vinte do século XVII, tomando como paradigma várias vilas e aldeias do planalto mirandês, habitadas por importantes comunidades de cristãos-novos que atravessam a fronteira conforme de onde se acendem os fogos da Inquisição. Aí, o ambiente de denúncia, a ameaça de prisão, a dissolução de costumes do clero, as perseguições permanentes, tornam o amor numa utopia e as relações entre as pessoas num inferno, deixando marcas profundas que se prolongam até aos nossos dias.
A língua aparece como um modo de curar, mas também como castigo, quase uma maldição, pressentindo-se as dificuldades no confronto das línguas presentes: o português, o castelhano e o leonês/mirandês.
Três séculos depois, um professor primário resgata um manuscrito onde aquele frade tentou escrever, na prisão, um tratado das artes de curar pela fala, fazendo comentários relativos à sua prática e continuando a questionar-se sobre o sentido da vida e o problema e Deus.
De modo sereno e inovador são abordadas questões que sempre preocuparam o homem, como o amor e o sexo, o bem e o mal, a liberdade, a religião, o viver em comunidade, através de uma época de fundamentalismos, de que ainda não nos livrámos e que não podemos esquecer.