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Jane Austen Portugal

O Blogue de Portugal dedicado à Escritora

Quando a Obra Ultrapassa o Autor

É ponto assente que Fanny Price e "O Parque de Mansfield" não reúnem consenso entre os muitos leitores de Jane Austen. Este livro faz parte, segundo alguns analistas literários, da segunda fase de escrita da autora. É mais denso, menos espirituoso e focado sobremaneira na moralidade. Esta última característica é personificada na figura principal do enredo, Fanny Price.

 

A menina frágil (fisicamente) e aparentemente apagada intelectual e psicologicamente chega a Mansfield Park com apenas 10 anos de idade. Repudiada por todos, inclusive pelos que tomaram a decisão de a recolher com o suposto intuito de lhe darem melhor condições de vida, encontra refúgio na atenção do seu primo Edward, segundo filho de Sir Tomas. Este pretende seguir a carreira clerical por vocação mas, também, por não ter outra alternativa, porquanto a herança da propriedade das terras de seu pai estava destinada ao seu irmão mais velho, é um rapaz culto. Em conversas com a sua recém chegada prima, descobre que esta é dotada de um espírito crítico e de uma boa dose de bom senso. Os diálogos entre os dois decorrem de forma serena. As suas opiniões convergem em quase tudo ao longo do romance, excepto no que toca à encenação teatral - Edward cede perante a força do restante grupo; Fanny mantém-se inalterável na sua posição e no que à personalidade dos irmãos Crawford concerne. No fim, sabemos que todos darão razão a Fanny Price pela sua aparente teimosia.

 

Tal final leva-me a pensar sobre quem teria influenciado quem. Foi Edward que moldou Fanny, tendo ela, como suposta obra (entenda-se aluna) superado o seu autor? Ou teria Fanny sido sempre mais astuta e intelectualmente mais capaz do que o seu primo?

 

Para mim, Fanny era uma pérola que precisava apenas de se descobrir. Edward deu-lhe um pequeno empurrão no mar calmo da literatura e da discussão que ela soube aliar às suas capacidades inatas, superando, em muito, o seu mentor.

Shoulda Known

"Teria Jane Austen a crença de que um escorpião nunca nega a sua natureza? Teria ela a convicção de que uma pessoa não era capaz de viver um arrependimento transformador que causasse uma revolução comportamental?  É estranho constatar isto, ainda mais quando é evidente que ela acreditava em segundas chances."

 

 

Esta é uma das frases de Cátia Pereira no seu artigo Jane Austen, Fanny Price, o Cepticismo e o Divino. Realço esta ideia porque é com ela que me debato constantemente nesta obra "O Parque de Mansfield".

Dei este título ao meu artigo porque a comparação com o escorpião que a Cátia fez recordou-me de uma música "Shoulda Known" do álbum "Got You on My Mind" de Madeleine Peyroux e William Galison que fala precisamente de um sapo que transportou às costas um escorpião na travessia de um rio, e quando o escorpião se viu no outro lado da margem, já a salvo, deu a picada fatal ao sapo que o ajudara (história esta que se transforma depois numa metáfora com um romance frustrado). Não deixa de ser curioso que tal comparação nos faça chegar a Mansfield Park!?

 

Eu acredito que Jane Austen acreditava verdadeiramente em segundas chances. E não apenas para os "bons da fita"... afinal, ela dá a Willoughby a oportunidade de se retratar, de se arrepender... permite que Marianne saia daquele romanticismo fanático... o próprio Tom Bertram é resgatado de uma vida de vício e jogo... Julia Bertram é salva ao último minuto, evitando um desfecho como o de Maria. Porquê? Não sei... mas todas as minhas suposições apontam para uma certa genuinidade de carácter e sentimentos e um profundo arrependimento.

 

Mas será que Jane acreditava que o mundo se dividia em bons e maus caracteres? Será que entendia que uma vez mau, sempre mau? Ou que a natureza humana estava destinada a ser exclusivamente boa ou má? Custa-me acreditar que tal fosse o caso. Ninguém é completamente mau nem completamente bom - todos temos defeitos e virtudes, uns preponderam sobre os outros consoante certas atitudes e comportamentos que tomamos.

O que me parece é que Jane tinha dificuldade em aceitar mudanças profundas em caracteres inundados em vícios, corrompidos por uma educação negligente, desviada, sem valores. No entanto, mostrou-nos que tal era possível com Willoughby, que tais caracteres eram capazes de arrependimento. Mas e de mudança? Só vos consigo apresentar o exemplo de Tom Bertram, cuja doença como que serviu para expurgar os males e vícios da sua conduta, um pouco à semelhança de Marianne, cuja doença serviu para expurgar o amor exacerbado e histérico e portanto, inconsequente. O próprio Darcy, alterou a sua conduta, conseguiu mudar o seu comportamente impregnado de orgulho, por amor.

 

Mas Henry Crawford? Sou sincera, achei que a determinada altura ele tinha dado o "clique". Mas ele não era constante e tinha muitos passos ainda para dar e não soube esperar, não teve paciência e se calhar, o troféu Fanny Price não era assim tão importante para ele, Maria Rushworth estava mais à mão, era mais fácil e simples... não lhe exigia nada, apenas lhe alimentava prazeirosamente o ego. Henry Crawford mostrou-se um escorpião, mas Fanny nunca se colocou na posição de sapo e por isso, sabemos, que nunca foi atingida.

 

A escrita de Jane Austen assenta muito nos valores, nos principios e Mansfield atinge muitas vezes a característica de ser moralista (para mim, excessivamente, por vezes). O que penso que ela nos queria mostar era que não temos de abdicar dos nossos valores e principios fundamentais para atingir a felicidade. Que não temos de ser rebeldes, revoltados, insatisfeitos e inconformados para conseguir alcançar objetivos. Podemos mudar a nossa vida, traçar o nosso caminho e percorrê-lo pela persistência, paciência e esperança. Que a nossa fidelidade àquilo que somos e à nossa consciência, trará as devidas e desejadas recompensas.

 

Jane Austen, Fanny Price, o Cepticismo e o Divino.

Escrever sobre Fanny Price e sobre Mansfield Park tem revelado a grata surpresa de que há muitas leitoras a partilharem, tal como eu, uma preferência por Henry Crawford. Tem sido agradável este feedback, através dos comentários, sobre o facto de que somos quase um "clube" a ansiar que Jane tivesse destinado para Fanny Price outro destino: render-se ao amor de Henry. Sabemos que não foi este o desenlace ocorrido e lamentamos...

 

Por que Jane Austen preferiu ignorar todas as provas de tentativas de mudança de Henry e fez com que Fanny não lhe cedesse afecto? Aquando da primeira vez que li Mansfield Park, esta foi uma pergunta que martelou a minha cabeça. Lembro-me perfeitamente da sensação de desconforto e da inconformidade com aquele final.  Durante algum tempo pensei que a razão principal seria manter a coerência da personalidade de Fanny Price, uma mulher de princípios rígidos e firmes. Mas, gradualmente -  e quanto mais tenho pensado nisso - constato que a razão ultrapassa Mansfield Park (apesar de ver bem evidente nesta obra) e é premente em toda a obra de Jane Austen.

 

Espero não estar a ser abusiva em afirmar que há um tom de cepticismo na forma como Jane desenha a sociedade e os inter-relacionamentos sociais da sua época. Os personagens, nas suas imperfeições e virtudes, apesar das vicissitudes e das falhas que cometem não modificam o seu comportamento. A única personagem que recordo sofrer alguma modificação foi Emma, ao ver as consequências de seus erros de julgamento. Ainda assim, no caso de Emma, a admissão dos erros e a correcção dos mesmos não geram uma mudança profunda de personalidade: Emma não deixa de ser Emma.

Henry Crawford, Willoughby, Mr. Frank Churchill, Mr. Wickham, Mr. Thorpe, General Tilney, Tia Norris, Fanny Dashwood - todos estes possuem um carácter duvidoso e Jane não deixa entrever uma mudança. O único sobre o qual caiu uma luz de esperança foi Henry Crawford, mas este também não resistiu.

 

Teria Jane Austen a crença de que um escorpião nunca nega a sua natureza? Teria ela a convicção de que uma pessoa não era capaz de viver um arrependimento transformador que causasse uma revolução comportamental?  É estranho constatar isto, ainda mais quando é evidente que ela acreditava em segundas chances. A sua obra é repleta de momentos em que os seus heróis vivem uma segunda chance: Elinor e Edward, Elizabeth e Darcy, Anne e Wentworth, Mr. e Mrs. Weston, entre outros. Seja por infortúnio seja por mal-entendidos, Jane Austen concedeu algumas segundas chances de emendar um erro e de refazer julgamentos precipitados. Por outro lado, quando o assunto era o carácter e a natureza do personagem parecia não haver ponto de variação: seria imutável. Admitia que o que pensamos de alguém pode ser algo formulado por um julgamento precipitado e, por isso, suceptível de sofrer modificação; mas quando o assunto centrava-se no que este alguém realmente é, na sua essência, isto nunca passaria por uma mutação.

 

A forma como Jane retrata a sociedade através de seus personagens é, muitas vezes, carregada de humor e isto leva a que seja-lhe imputado uma tónica de crítica social.  Será? Será que podemos admitir isso. Reconheço-lhe uma enorme capacidade de observação e de destaque dos pontos fracos da sociedade, mas ao fazer isto estaria ela a preconizar, a defender ou a antever uma real mudança da sociedade? Experimento uma hesitação em responder esta questão.

 

Ao admitir uma Fanny Price de carácter irrepreensível e de virtudes constantes e, ao mesmo tempo, ao criar um Henry Crawford perpetuamente falho e imperfeito; Jane Austen gera um desequilíbrio. Parece que estamos diante de dois pesos e duas medidas. Neste ponto do meu devaneio, interrogo-me se Jane não estaria certa: a perfeição não sofre alteração mas o imperfeição nunca poderá modificar-se de forma a tornar-se perfeita. Quase uma separação entre o divino e o humano.  Como diria Henry, Fanny é uma visão angelical. Alguém a quem dificilmente outro ser humano chegaria perto sequer. Talvez - se concedermos que os personagens tem vida própria para além da pena do escritor e do olhar do leitor Henry Crawford tenha se rendido submisso ao cepticismo de Jane Austen e constatado que nunca estaria à altura de Fanny. 

 

Como vêem,  Jane Austen afigura-se aos meus olhos como uma mulher, até certo ponto, indecifrável. Não sei se seria uma mulher céptica e conservadora ou se seria crítica e progressista. Neste aspecto, Fanny Price e a sua perfeição divina não me ajudam a chegar a uma conclusão definitiva. 

Boas oportunidades.

Esta é uma excelente altura do ano para comprar livros. Já há algum tempo que há esta tendência das livrarias e das editoras em fazer promoções de livros na época de saldos. Acreditem, não se trata somente daqueles livros que são fracassos editoriais. Pode-se encontrar excelentes títulos a bom preço. E a verdade é que a minha atenção anda sempre desperta para bons preços. Claro que um livro é um bom investimento mas sabemos que neste tempo de crise alguns preços tornam-se, por vezes, proibitivos.

 

Então, vou deixar algumas dicas.

 

Europa-América:

Mansfield Park - Jane Austen - Europa-América

Já que temos estado a falar sobre Fanny Price e "Mansfield Park", devo dizer-vos que se forem ao site da Europa-América, encontram o livro a €14,59.

É um preço excelente porque quando eu comprei o meu exemplar o preço nas livrarias era de €29,90. Na altura, aproveitei uma oportunidade na Feira do Livro para comprar a €22,00. Por isso, se não tiverem o livro trata-se de um oportunidade de o adquirir.

 Mas não é o único livro em promoção no site da Europa-América. Também podemos encontrar:

Sensibilidade e Bom Senso a €8,45 (preço anterior €16,91) 

Persuasão a €9,04 (preço anterior €18,07) 

Abadia de Northanger €10,09 (preço anteior 20,17) 

Emma €20,11 (preço anterior €25,13) 

Amor e Amizade €7,52 (preço anterior €15,04) 

 

 

Bertrand.pt

O que eu mais gosto no site da Bertrand é a facilidade com que podemos encontrar alguns títulos em inglês de obras inspiradas e/ou sobre Jane Austen. Alguns obras estão com um desconto aliciante. Quero destacar esta: Sense and Sensibility | Penguin Books 15,87 (preço anterior € 17, 63) Destaco esta edição de S&S  pela ilustração da capa, da autoria de Audrey Niffenegger. É linda. Sigam o link e vejam. 

 

 

Fnac.pt

No que diz respeito a Jane Austen, a Fnac não possui diversidade de títulos.

A promoção marcante neste site é: Persuasão | Editorial Presença €7,55 (preço anterior €10,08)

 

Wook.pt

A semelhança da Bertrand para além da obra de Jane Austen, a Wook tem uma grande variedade de livros inspirados e/ou sobre Jane Austen.  Alguns livros, tem 10% de desconto mas não encontrei nenhuma promoção significativa. 

 

 

Para quem segue o JAPT e nunca leu Jane Austen esta é uma boa oportunidade de aquisição de livros da nossa escritora amada a um bom preço.  Principalmente na Bertrand e na Fnac, as promoções referem-se ao site. Contudo, se forem às lojas físicas encontram outras promoções. Este fim-de-semana estive em ambas livrarias e encontrei livros a metade do preço.  São boas oportunidades a não perder. 

Fanny e suas versões.

Não acredito que uma adaptação para a televisão/cinema tenha de ser totalmente fiel a cada vírgula de um livro no qual o seu argumento se baseie. Tenho a certeza de que já teria deixado aqui esta minha afirmação. Embora goste de ver um filme ou série que segue a narrativa de um livro, não me incomoda que a versão filmada tome alguma liberdade; o oposto seria omitir a criatividade de uma obra.  Contudo, não posso também deixar de dizer que o único factor que me transtorna um pouco é quando uma filme ou série foge à essência da obra literária. Isto já acho um pouco irritante.

Se nunca tivesse lido Mansfield Park, se esta obra não tivesse se tornado uma das minhas preferidas e  se nunca tivesse tido o prazer de conhecer os pensamentos e acções de Fanny Price,  tenho a convicção de que toleraria melhor as versões de 1999 e de 2007.

Sem entrar em outros detalhes das duas versões - e isto levaria muitos parágrafos - gostaria apenas de centrar a atenção na forma como Fanny Price foi representada em ambas a versões.

 

 

MANSFIELD PARK | 1999 | Miramax 

Direcção e argumento: Patricia Rozema

 

Fanny Price -  Frances O'Connor

 

Frances O'Connor cria uma Fanny Price com vitalidade e energia. Por momentos, não sei bem se estou a ver Fanny Price, Elizabeth Bennet ou a própria Jane Austen. Concluo que Fanny Price não é, de certeza… Acho que nesta versão há um pouco esta intenção, de nos mostrar uma Fanny que, no fundo, é uma Elizabeth Bennet e que diz umas frases de Jane Austen. A energia de Fanny está na força do seu carácter e da sua determinação em ser correcta; e, não propriamente em descer escadas a correr e andar a saltitar por Mansfield Park. Há vários momentos, ao longo do filme, em que a vemos a ser exactamente o oposto de Fanny; ou seja, ao contrário de ser silenciosa e obediente, Frances/Fanny responde precipitada, apaixonada e veementemente. Há momentos em que mostra-se muito distante da nossa discreta Fanny.

 



 -MANSFIELD PARK |2007 | ITV  

Direcção:  Iain B. MacDonald | Argumento: Maggie Wadey


Fanny Price - Billie Piper

Com Billie Piper assistimos uma Fanny Price mais infantilizada. Melhor dizendo, uma Fanny mais nova e ainda menina. Também ela, enérgica e vivaz. Surge, também,  a correr e a saltitar por Mansfield Park.  Mostra-se mais frágil, observadora, doce e silenciosa; contudo, não tem a fibra de carácter, o tipo físico e a maneira de estar de Fanny Price que Jane Austen descreve. Billie Piper, mesmo sendo bela, foge ao tipo físico frágil que a Fanny Price deveria apresentar e, arrisco-me a dizer, tem até um ar sensual que em nada condiz com uma personagem de Jane Austen. Outro aspecto físico que me incomodou foi o facto dela ter sido caracterizada em grande parte do filme com o cabelo desgrenhado. Sei que este aspecto foge ao domínio da interpretação da actriz, mas certo é que influencia a forma como a vemos no seu todo.

 

 

 

Há um aspecto de que gostei em Billie Piper: ela conseguiu, algumas vezes, demonstrar a desconfiança que tinha em relação à Mary Crawford; bem como a mágoa de ter sido preterida pelo primo surgia como um sentimento muito evidente. Este é um mérito que não consigo encontrar em Frances O'Connor.

Apesar de liberdade criativa que cada argumento adaptado tem direito, bem como o seu próprio enfoque, desgosta-me profundamente que uma história tão densa e profunda como Mansfield Park e a sua personagem principal tenham sido desenhadas de uma forma tão superficial. Aponto o dedo mais ao argumento de ambos os filmes do que propriamente às actrizes.

Uma certeza é muito viva para mim: Fanny Price merecia ser melhor apresentada. 

 

Razões de impopularidade.

Fanny não é marcante, forte, fulgurante, saltitante, destemida ou cómica. Fanny é constante, séria, frágil, de saúde e constituição delicada, firme e discreta. Estas não são virtudes que chamem a atenção ou que façam com grande parte dos leitores afirmem: "Como eu queria ser como Fanny!". Não. É mais certo afirmar que Fanny é mais seguramente vista como passiva, conformada, enfadonha e sem qualquer tipo de graça.

Então, não causa estranheza constatar que Fanny Price não desperte simpatia e que seja a heroína mal amada.

A personalidade de Fanny Price é grandemente determinada pelo meio que a cerca. A sua passividade e conformismo quanto ao seu papel e destino naquela casa geraram-se pela forma como foi tratada desde o momento de que saiu do seu próprio lar. Ela é da família mas a fronteira foi delimitada desde o início: era a parente pobre beneficiada pela caridade do tios. Dado isto, Fanny procurou sempre ser útil e grata; mesmo quando tratada injustamente. Salvou-lhe da tristeza da sua condição a generosidade e afecto de seu primo Edmund. Porem, até mesmo a sua condição física débil resulta em grande medida de ser-lhe negado conforto.

Apesar do seu papel em Mansfield ser claro penso, muitas vezes, que o caminho mais conveniente para Fanny teria sido ela tornar-se numa pessoa manipuladora, bajuladora e de má índole. Se ela tivesse adoptado uma postura de lisonja para com a sua Tia Norris, não teria esta a tratado com mais brandura? Se ela tivesse sido uma cúmplice de suas primas, não teria alcançado outro posto em Mansfield? Teria sido tão mais fácil sobreviver com regalias, conforto e estima… Acho que até os leitores a achariam mais atraente se ela tivesse sido desvencilhada e lutadora.

O único aliado de Fanny é a virtude. Ela é, com certeza, uma personagem que personifica a virtude. Não cede, não esmorece, não vacila. Mesmo que veja o seu próprio nome e bem-estar posto em causa, ela não pestaneja. Convenhamos, nos moldes actuais, isto não desperta muita simpatia. No fundo, não queremos heroínas virtuosas. Se Fanny cedesse a Henry Crawford ou se rebelasse contra a própria família fria e opressora, não a olharíamos com mais simpatia? Não pensaríamos secretamente "É assim mesmo, Fanny. Tens fibra!"? 

O mais curioso nisto tudo é que as únicas pessoas que viram a grandeza de Fanny Price foram os dois personagens de carácter mais duvidoso: os Crawford. Ambos, Henry e Mary, viram quem realmente Fanny era e o seu valor. 

Fanny não tem a presença de espírito de Emma Woodhouse, não tem a personalidade apaixonada de Marianne Dashwood, não é frontal e saltitante como Elizabeth Bennet, não tem a frescura e vitalidade de Catherine Morland, não tem a classe de Elinor Dashwood e não tem a elegância de Anne Elliot. Fanny é apenas alguém que encara a sua vida existe para servir aos outros, para ser grata e para ser correcta.

Fanny não é, de facto, popular. Se Fanny Price fosse nossa contemporânea nunca seria capa da revista Caras. Imagino-a como alguém anónima que estaria em alguma obra humanitária a fazer a diferença na vida de muitas pessoas. Portanto, não me causa tanta estranheza que ela seja uma heroína impopular e mal-amada. Ela seria (e é) autêntica. Não seria uma pessoa ofuscante mas seria impressionante para quem a quisesse conhecer.

Grandeza.

 

 

 

Quando penso em todas as razões que me levam a amar a obra de Jane Austen passo por um processo de indefinição… São tantas as razões!

 

Há um aspecto que me mantém cativa: o facto de que cada livro tem uma identidade própria. Quando sinto necessidade de reler algum de seus livros, direcciono o meu olhar para a prateleira onde carinhosamente guardo a sua obra e sei que determinado livro é o indicado para um estado de espírito específico. À parte o facto de Jane nos ter deixado poucos livros, alegro-me com o facto da riqueza que cada um possui. Cada herói e heroína, cada cenário, cada palavra nos remete para outra dimensão que, muitas vezes - salvo as devidas proporções - é tão semelhante ao mundo que vivemos e a algumas pessoas que nos cercam.

 

A particularidade de cada livro remete-nos de imediato para a protagonista de cada história. Não nos enganemos, há imensos heróis que amamos (Wentworth, Mr. Knightley, Mr. Darcy, Mr. Tilney, etc) mas a verdade é que o foco são as mulheres - a forma como elas sentem, pensam, veem o mundo e a sociedade que as cerca. Se juntarmos todas as heroínas de Jane - como fizemos na Shortstory.2 - constatamos que todas têm personalidades distintas. Acredito que em cada protagonista de cada livro há algo da própria personalidade de Jane Austen. Conseguirá o escritor descolar-se completamente de seus heróis? 

 

Eu gosto de pensar que Fanny Price encarna a capacidade de observação e a discernimento que acredito Jane Austen possuíra.  Fanny é mais uma observadora do que uma interventora. Não é ela que faz a acção de Mansfield Park ter um desenvolvimento. Todos os outros personagens  fazem a história desenrolar-se, ela observa e avalia. Mas o resultado da sua observação era algo que somente a si própria pertencia, apenas partilhando pontualmente com o irmão ou com o primo Edmund. Mas

naquela casa e família a sua opinião era algo totalmente irrelevante. Imagino que se uma opinião fosse solicitação a Fanny, a sua odiosa  Tia Norris exclamaria "Mas Fanny pensa sequer para poder ter opinião?". Toda a família que, apesar de não terem a mesma violenta e impiedosa postura da Tia Norris, teriam de igual forma a repugnante postura de ignorá-la.

 

Portanto, a clareza de pensamento e de valores da Fanny eram - dentre outras qualidades - as que me fazem ver que estas seriam qualidades que Jane Austen possuíria. É através dos olhos de Fanny que vemos toda a corrupção de valores, de sentimentos e de postura de todos os que a cercavam. É através da observação de Fanny que constatamos a hipocrisia da sociedade. Jane Austen era um excelente retratista da sua época, cada palavra e cada frase apontavam para as particularidades e defeitos de sua época.

 

Mansfield Park é uma obra riquíssima. Densa, lenta e silenciosa; mas profunda. Destrinça ao pormenor a ausência de valores e inconstância humana. Fanny, também ela profunda e lúcida.

 

Sei que Fanny é, provavelmente, a menos popular de todas as heroínas. Uma heroína mal amada. Para mim, ela é imensa, grande, paira muito acima.

 

Fanny Price, dedico-te o meu afecto, respeito e admiração. 

Top Jane Austen

Melhor "Conquistador"

 

Eu escolho George Wickham de “Orgulho e Preconceito”, pois ao longo da trama, ele seduziu com seu charme e astúcia: as irmãs Bennet, principalmente, Lizzy e depois Lydia; Mary King; Georgiana Darcy, além de toda a sociedade local, incluindo o desconfiado Sr. Bennet. Este sim sabe seduzir as pessoas!

 

Melhor amiga preferida 

 

Eu devo confessar que não gosto da idéia de uma só melhor amiga, eu gosto de várias melhores amigas, pois na minha vida particular eu tenho poucas amigas, mas todas são melhores amigas. Desde modo, eu sugiro que se passearmos pelas obras de Jane Austen poderíamos construir um grupo de amigas preferidas dinâmico, muito rico em diversidade e cumplicidade, que qualquer um de nós gostaria de fazer parte.

 

Eu gosto muito da postura e companheirismo de Lady Russel em “Persuasão”.  Ela é meio rigorosa em relação a convenções sociais, mas é dotada de sensatez e praticidade, qualidades que admiro nas pessoas. Além disso, ela é tão cuidadosa com Anne Elliot, preocupa-se com ela e zela pelo seu bem-estar.

 

Eu admiro muito a relação de Elinor Dashwood e sua irmã Marianne, elas são cúmplices e convivem muito bem com suas diferenças. Eu adoraria ter Elinor como melhor amiga, ela é cuidadosa, empática e excelente conselheira, pois segue o lado racional da questão, condição que me agrada muito e ajuda na resolução de problemas.

 

Outra opção para o nosso grupo seria Charlotte Lucas de “Orgulho e Preconceito”, ela é prática, cúmplice e franca, não esconde nada de sua amiga, justifica todas as suas ações para não haver mal entendido.

 

Não posso me esquecer também de Elinor Tilney de “A Abadia de Northanger” e Mrs. Weston de “Emma”, ambas são tímidas, reservadas, mas boas ouvintes e confidentes.

 

Melhor personagem cômico

 

Mr. Collins de “Orgulho e Preconceito”. Ele é hilário!!! Sua devoção a Lady Catherine é comovente e deprimente, ao mesmo tempo. Como ele consegue ser tão grudento e inoportuno, realmente é um dom admirável, que ele exercita amiúdas vezes.

 

Melhor história de amor secundária 

A história de amor secundária que mais me chamou a atenção foi a de Jane Fairfax e Frank Churchill em “Emma”. Eu acho que a história deles daria uma obra à parte, pois é muito complexa, envolve sentimentos intensos e grandes conflitos que, na minha humilde opinião, poderiam ser mais explorados e garantiriam uma linda história. Jane sofre tanto ao longo da história por este amor secreto, eu sinto pena dela, tão solitária e quieta e ainda com uma tia como Mrs. Bates para ajudar! Coitada! É uma história que me aguçou a curiosidade e esta não foi saciada, ficou a mercê de minha imaginação.

 

Personagem masculina secundária preferida

 

São vários os bons exemplos de personalidades masculinas construídas por Jane Austen em seus romances, não posso deixar de mencionar: Mr. Bennet e Coronel Fitzwilliam de “Orgulho e Preconceito”; Comandante Harville e o Almirante Croft de “Persusão”; William Price de “Mansfield Park”; Mr.Weston de “Emma”.

 

Personagem masculina secundária menos preferida  

 

Há vários personagens secundários masculinos com os quais eu não me simpatizo, mas o mais chato e cansativo é John Thorpe de “A Abadia de Northanger”. Que sujeito mais presunçoso e arrogante! Além de ser enfadonho, ele atrapalha demais a vida de Catherine Morland, tomando decisões por ela e forçando-a ter um relacionamento com ele. Infelizmente, creio eu, nos dias de hoje ainda encontramos vários deste tipo no nosso cotidiano e, definitivamente, não é fácil conviver com eles!

 

Personagem feminina secundária preferida 

 

Eu estou muito dividida neste tópico. Eu prefiro não ser enfática e escolher apenas uma, vou citar várias, assim eu faço justiça a todas: Mary Bennet e Charlotte Lucas de “Orgulho e Preconceito”; Mrs. Jennings de “Razão e Sensibilidade”; Lady Russel de “Persuasão”; Mrs. Weston de “Emma” e Elinor Tilney de “A Abadia de Northanger”. São mulheres simpáticas, suaves, sinceras, bem resolvidas consigo mesmas e sensíveis aos sentimentos e dificuldades de nossas heroínas.

 

Personagem feminina secundária menos preferida 

 

Eu também tenho várias escolhas para personagem secundária menos preferida, não me simpatizo nenhum pouco com: Caroline Bingley de “Orgulho e Preconceito”; Mary Crawford e Mary Bertram de “Mansfield Park”; Fanny Dashwood (odeio!) e Lucy Steele de “Razão e Sensibilidade”; Elisabeth Elliot de “Persuasão”; Isabela Thorpe de “A Abadia de Northanger”; Mrs. Elton de “Emma”. São todas invejosas, mesquinhas, manipuladoras, vislumbradas com status social e fortuna, arrogantes. Eca!  

 

Relação de família  preferida

 

Eu adoro ler e acompanhar as relações entre as irmãs Bennet de “Orgulho e Preconceito”, pois são muito alegres e divertidas; e também a relação entre as irmãs Dashwood em “Razão e Sensibilidade”, que é marcada pelo companheirismo e cumplicidade.

 

Mais frustrante relação de família

 

A relação de Anne Elliot com seu pai e sua irmã Elisabeth em “Persuasão”. É terrível “presenciar” a forma como eles a tratam e são insensíveis as suas necessidades e sentimentos.

 

Melhor proposta recusada

 

Com certeza,  a recusa de Elisabeth Bennet à proposta de casamento feita por Mr. Collins em “Orgulho e Preconceito”. É muito engraçado as justificativas dele para ela aceitar seu pedido e as desculpas que ele inventa por ela não aceitar esta proposta irresistível de casamento. Eu me diverti muito!