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Jane Austen Portugal

O Blogue de Portugal dedicado à Escritora

Casting Mr Darcy

Li recentemente numa entrevista antiga da Keira Knightley (Elizabeth Bennet na versão cinematográfica de 2005 de Orgulho e Preconceito) que o Matthew MacFadyen foi escolhido para o papel de Mr Darcy depois de ter representado, nas audições, aquela cena maravilhosa da proposta de casamento à chuva.

 

"Representei essa cena com todos os actores que concorreram para o papel de Mr Darcy" - disse Keira que foi escolhida para o papel antes de saberem quem faria o principal papel masculina desta obra de Jane Austen - "A forma como Matthew e eu interagimos nessa cena não estava no guião. No entanto, pareceu-nos correcto. Deixamo-nos levar quase inconscientemente, e muito rapidamente fizemos a cena. Estavamos literalmente com os rostos colados. E, quando parecia que um beijo ia sair, ambos nos afastámos um do outro, sem que antes tivessemos combinado".

 

Keira refere ainda que, depois desta audição, houve um completo silêncio na sala, tal foi a empatia percebida entre os dois actores.

 

Matthew MacFadyen foi escolhido para o papel de Fitzwilliam Darcy, senhor de Pemberley, logo depois.

 

É uma das minhas cenas favoritas de Orgulho e Preconceito (2005) apesar de não ser fiel à obra original.

 

Que seja infinito

 

Quando lemos um livro de Jane Austen podemos contar com um final feliz. É agradável acompanhar as aventuras e desventuras dos protagonistas e, no fim, vermos que os mesmos foram recompensados. Não sendo à imagem e semelhança da vida real, faz o coração encher-se de esperança e alegria.

Não é assim quando pensamos em Elizabeth Bennet e Mr. Darcy?

Quem leu "Orgulho e Preconceito" não seguiu com  pleno entusiasmo as voltas e reviravoltas da trama?

Quem não vibrou com a carta de Mr. Darcy?

Dei por mim, inúmeras vezes,  a pensar "Lizzie, sua tonta, não deixe Mr. Darcy escapar!".

Vemos o nascimento e crescimento de um sentimento, chegámos ao final e temos um "felizes para sempre".

Pergunto-me: será mesmo para sempre?

 

Tenho dificuldade em aceitar que Lizzie e Darcy viessem a ter um casamento pacífico.  Acho até que seria um casamento um pouco atribulado. No fim das contas, tratou-se de uma união desigual social e economicamente falando. No contexto da época, isto seria tolerado mas não bem aceite. Tenho certeza de que ela seria olhada um pouco de lado e difamada por pessoas como Lady Catherine de Bourgh ou Miss Bingley. Seria olhada, talvez, como alguém inferior. Confio na auto-confiança de Lizzie e na firmeza de Darcy para fazer valer o seu papel como Mrs. Darcy e senhora de Pemberley; mas mesmo assim, isto teria algum efeito no relacionamento.

 

Contudo, o maior problema na vida dos Darcy seria a própria família de Lizzie. É bem verdade, que não casamos com a família  mas é facto que esta não pode ser ignorada. E este poderia ser um constrangimento entre ambos. Conseguem imaginar um fim-de-semana em família com o Mr. Darcy a tomar o pequeno-almoço em presença de Mrs. Bennet? Eu não consigo… Imagino-o a levantar-se bem cedo e tomar o pequeno-almoço antes da sogra para não ter que ouvir a sua voz estridente. Lizzie teria de ser muito paciente…

 

Não tenho qualquer dúvida que o triunfo desta união reside na comunicação. Há uma capacidade de entendimento entre ambos. Uma vontade de partilha e descoberta. Imagino-os confiantes, confidentes, cúmplices e companheiros. Por todos estes motivos, Elizabeth Bennet poderia sorrir porque a vida lhe foi generosa e concedeu-lhe a possibilidade de viver um grande amor e de o fazer valer. Cabe-lhe a ela saber gerar tolerância e harmonia. Está nas suas mãos fazer da sua história algo de infinito... com Darcy sempre ao seu lado.

dons e talentos #1

- a questão da mulher prendada -

qualidades e talentos para o casamento

 

 O objectivo fundamental da vida da mulher seria o casamento: arranjar um marido adequado, procriar e, futuramente, auxiliar os filhos e as filhas a arranjarem a noiva adequada. Tudo girava em torno disto. Certo é que nem todas conseguiriam encontrar alguém que correspondesse às expectativas, ou sequer fossem beneficiadas por uma proposta de casamento. Não sei se será exagero meu dizer que a profissão da mulher seria o matrimónio. E, como em qualquer profissão, implica um aprendizado e o desenvolvimento de certas “habilidades”. Não sei, talvez seja um pensamento cruel e triste aos nossos olhos cheios de século XXI.

 

 

 

"It is amazing to me," said Bingley, "how young ladies can have patience to be so very accomplished as they all are."

"All young ladies accomplished! My dear Charles, what do you mean?"

   "Yes, all of them, I think. They all paint tables, cover screens, and net purses. I scarcely know any one who cannot do all this, and I am sure I never heard a young lady spoken of for the first time, without being informed that she was very accomplished."

   "Your list of the common extent of accomplishments," said Darcy, "has too much truth. The word is applied to many a woman who deserves it no otherwise than by netting a purse or covering a screen. But I am very far from agreeing with you in your estimation of ladies in general. I cannot boast of knowing more than half a dozen, in the whole range of my acquaintance, that are really accomplished."

"Nor I, I am sure," said Miss Bingley. "Then," observed Elizabeth, "you must comprehend a great deal in your idea of an accomplished woman."

 "Yes, I do comprehend a great deal in it."

   "Oh! certainly," cried his faithful assistant, "no one can be really esteemed accomplished who does not greatly surpass what is usually met with. A woman must have a thorough knowledge of music, singing, drawing, dancing, and the modern languages, to deserve the word; and besides all this, she must possess a certain something in her air and manner of walking, the tone of her voice, her address and expressions, or the word will be but half deserved."

   "All this she must possess," added Darcy, "and to all this she must yet add something more substantial, in the improvement of her mind by extensive reading."

   "I am no longer surprised at your knowing only six accomplished women. I rather wonder now at your knowing any."

   "Are you so severe upon your own sex as to doubt the possibility of all this?"

   "I never saw such a woman. I never saw such capacity, and taste, and application, and elegance, as you describe united."

 

Esta passagem de "Orgulho e Preconceito" é, provavelmente, um dos melhores exemplos desta questão da "mulher prendada".  Mr. Bingley levanta a questão ao manifestar a sua admiração pelo facto de moças tão jovens serem habilidosas em tantas actividades como a pintura, bordado, dança, canto. A irmã mostra-se escandalizada  com o comentário dele como se fosse um absurdo pensar o oposto e se isto não fosse exercido com o máximo de excelência. A irmã chega a afirmar que uma mulher para ser realmente prendada tem de ter uma postura com "algo mais" ("she must possess a certain something in her air and manner of walking"). Darcy acha que poucas serão as mulheres realmente prendadas e Elizabeth, diante da concepção deles, acha que não existirá sequer uma.

 

Todo este diálogo é extremamente interessante. Em primeiro lugar, porque demonstra que a questão das jovens terem habilidades que fossem visível aos olhos de todos seria um factor que a qualificaria como alguém a ser valorizado e ponderado ou não numa presumível união. Para além do bom nome, posses, quiçá de um título, ser "prendada" era fundamental. Principalmente, para conseguir fazer um futuro matrimónio. Principalmente quando Mr. Bingley diz que "I am sure I never heard a young lady spoken of for the first time, without being informed that she was very accomplished" ele está a afirmar que sempre que ao ser apresentado a uma jovem esta informação é logo disponibilizada.

 

Na geração das nossas mães, uma mulher prendada é aquela que administrava o lar, ou seja, fazia a economia do lar, cozinhava, lavava e passava roupa (no tanque, s.f.f), costurava,  limpava a casa, cuidava dos filhos, tinha a comida feita nas horas certas e - se fosse muito moderna - tinha um emprego. Tudo isso, com um sorriso nos lábios. Uma mulher prendada nunca reclamava do seu destino, fosse ele qual fosse. Estava casada, tinha filhos e recebia sustento (na maior parte dos casos) do marido. Esse era o seu papel. Em meios pequenos, buscava-se - antes do casamento - saber se a mulher era de boas famílias e se tinha sido preparada para ser uma boa dona de casa.

 

Na nossa geração, não tenho certeza se este conceito de "mulher prendada" continua a existir de facto.  Pelo menos, não nesta concepção de ter de ser uma mulher sobrenaturalmente dotada de todas as habilidades dentro do lar. Acho que, em concreto, somos todas prendadas: aprendemos com nossas mães a lidar com a casa, mas estudamos, trabalhamos, abraçamos uma profissão e, imaginem, procuramos tempo para nós mesmas.

 

Esta questão sobre a mulher "prendada" na obra de Austen, faz-me sempre relembrar as teorias que encaram Jane como uma escritora a preconizar o feminismo. Há momentos em que concordo. Principalmente quando leio a reacção de Elizabeth Bennet ao discurso de Darcy e de Caroline Bingley no trecho acima transcrito. Contudo, quando leio outros trechos em que é abordada a questão e o interesse nos rendimentos que ambos pretendentes poderão vir a usufruir com o matrimónio faz-me pensar duas vezes se se tratará de uma crítica social ou se ela encararia esta questão como natural e, por isso, aceitável. A certeza que nutro é que Jane Austen não era como as mulheres de sua época e, parece-me, não tinha as mesmas ambições que as outras teriam. Talvez, por isso, a escrita: onde ridicularizava o que não aceitava, diminuía o que reconhecia valor e exaltava o que achava ser importante. Tudo o que escrevi são ilações mas, talvez, algumas possibilidades.

You’ve got mail e Jane Austen

Joe Fox: Oh right, yeah, a snap to find the one single person in the world who fills your heart with joy. 

Nelson Fox: Well, don't be ridiculous. Have I ever been with anyone who fit that description? Have you? 

[ You’ve got mail ]

 

Há muitos filmes que são adaptações, alguns são inspirados e outros fazem alguma referência à obra literária de Jane Austen. You’ve got mail, do meu ponto de vista, não faz apenas referência, é inspirado em Orgulho e Preconceito de Jane Austen. Em Joe Fox/Tom Hanks e Kathleen Kelly/Meg Ryan podemos identificar Mr. Darcy e Elizabeth Bennet. Mas esta identificação não é imediata. Não se trata daqueles filmes que pensamos “Ok, a tua base é O&P” e andamos à caça de todos os personagens do livro. Não. Este filme foca a questão subjacente que Jane Austen sempre quis destacar em O&P: o erro que caímos quando nos fiamos nas primeiras impressões. Falamos de duas pessoas que se conhecem antes de se conhecerem de facto. Joe e Kathleen correspondem-se por emails, sem se conhecerem, e fazem-no sem se identificarem com os seus verdadeiros nomes. Apenas identificam-se através de um nickname. Falam sobre as coisas aparentemente pequenas do quotidiano, mas sem revelarem dados concretos de suas vidas privadas. Acabam por se conhecer em concreto, contudo, sem saberem que se correspondem. A primeira impressão é horrível. Detestam-se, espicaçam-se e evitam-se. A antipatia é latente. Ele, porque a vê como um obstáculo a ser ultrapassado profissionalmente; ela, porque o vê como a causa do infortúnio do seu negócio. Há todo este pano de fundo do sector livreiro: ele, um grande empresário e dono de uma cadeia de livrarias de grande alcance; ela, dona de uma pequena livraria de literatura infantil. O facto de serem concorrentes no ramo das livrarias é o tempero que dá sabor a esta história. Há este duelo de vontades, de olhares e de palavras. Um “duelo” bem ao estilo “Darcy/Elizabeth” que fascina a cada momento do filme.

 

Joe Fox é quem primeiro descobre a verdade sobre a identidade de ambos enquanto correspondentes. Ele descobre e ela ignora a verdade. A cena em que eles vão se encontrar num café para se conhecerem faz-me sempre lembrar a cena em que Darcy declara-se pela primeira vez a Elizabeth. Não pela semelhança de acções mas por tratar-se do momento de viragem da história. Ele, tal como Darcy, quer demonstrar a Kathleen que a primeira impressão que ela tem dele não é a verdadeira. Ele quer conquistá-la. Ele tenta, sem se revelar, fazer com que ela goste tanto dele – Joe Fox – como do “NY152” (seu nickname). Ao baixar as defesas também Kathleen mostra-se como ela realmente é, tal e qual a sua “Shopgirl”.

 

A dinâmica entre eles faz lembrar aquela máxima que defende que odiamos na mesma intensidade em que amamos. Há intensidade, sobretudo. A verdade é que se eu ouvisse Joe Fox a dizer “You must allow me to tell you how ardently I admire and love you” para a Kathleen Kelly, não acharia estranho.

Melhor proposta recusada

"I might as well inquire," replied she, "why with so evident a desire of offending and insulting me, you chose to tell me that you liked me against your will, against your reason, and even against your character? Was not this some excuse for incivility, if I was uncivil? But I have other provocations. You know I have. Had not my feelings decided against you--had they been indifferent, or had they even been favourable, do you think that any consideration would tempt me to accept the man who has been the means of ruining, perhaps for ever, the happiness of a most beloved sister?"

 

As she pronounced these words, Mr. Darcy changed colour; but the emotion was short, and he listened without attempting to interrupt her while she continued:

 

"I have every reason in the world to think ill of you. No motive can excuse the unjust and ungenerous part you acted there. You dare not, you cannot deny, that you have been the principal, if not the only means of dividing them from each other--of exposing one to the censure of the world for caprice and instability, and the other toits derision for disappointed hopes, and involving them both in misery of the acutest kind."

 

She paused, and saw with no slight indignation that he was listening with an air which proved him wholly unmoved by any feeling of remorse. He even looked at her with a smile of affected incredulity.

 

"Can you deny that you have done it?" she repeated.

 

 

Relação de família preferida

Adoro o relacionamento da Elizabeth com o pai. É certo e sabido que ela é a filha preferida de Mr Bennet mas talvez porque seja a mais parecida com ele e que compartilha com ele a paixão pela leitura e a tranquilidade que essa actividade proporciona.

 

Estou a imaginar uma "Little Elizabeth" pendurada no colo do pai, ambos a lerem o mesmo livro, com o mesmo interesse  e alegria.