LEITURA COMPARADA DE "PRIDE AND PREJUDICE" DE JANE AUSTEN NAS SEGUINTES TRADUÇÕES:
"Orgulho e Preconceito" (Nuno Castro) E "Orgulho e Preconceito" (Lúcio Cardoso)
Capítulos 6 ao 10
Estes são capítulos muito interessantes porque vemos através deles, as reacções dos Bennet e dos Lucas aos novos vizinhos. Mr. Bingley pela simpatia e Mr. Darcy pela arrogância imperam no assunto de conversação entre as famílias e, principalmente, entre as mulheres. Jane Bennet é convidada a jantar com as Bingley e acaba por permanecer alguns dias em Netherfield por contrair um grande resfriado. Tal resultou de uma artimanha de Mrs. Bennet para fazer com que a filha pernoitasse lá e pudesse mais tempo na companhia de Mr. Bingley. Elizabeth, preocupada com irmã, dirige-se a Netherfield e acaba por também ficar por lá a acompanhar a recuperação da irmã. Durante esses dias, decorrem diálogos extremamente interessantes entre os personagens. Permite-nos ver e compreender melhor a personalidade dos novos vizinhos e também ver, mais especificamente, a própria evolução dos sentimentos de Mr. Darcy por Elizabeth Bennet.
DIFERENÇAS
EN | "Had she merely dined with him, she might only have discovered whether he had a good apetite (…)" P&P, chapter 6, pg 25
PT | "Se ela tivesse simplesmente jantado com ele, talvez tivesse descoberto apenas se era umbom garfoou não" O&P, cap.6 , pg 16
BR | "Se ela tivesse apenas jantado com ele, poderia somente ter descoberto se ele tem bom apetite" O&P, cap.6 , pg 32
As expressões estão correctas mas confesso que tenho um fraco pela expressão "bom garfo". É uma expressão muito visual e sugestiva, que dá a entender alguém que usufrui um grande prazer em comer.
EN | "If I wish to think slightingly of anybody's children, it should not be of my own, however." P&P, Chapter 7, pg 32
PT | "Se eu quisesse criticar as filhas de alguém, certamente não seriam as minhas. " O&P, cap.7 , pg 20
BR | "Se eu quisessemenoscabaros filhos de alguma pessoa, decerto não escolheria os meus ." O&P, cap.7 , pg 40
Ambas as traduções reflectem a ideia da expressão "think slightingly"; contudo, apreciei imenso a tradução brasileira e a adopção da palavra "menoscabar". Eu desconhecia esta palavra. Experimentem pronunciá-la; a sua própria sonoridade indica, por si só, a ideia de desprezo.
DÚVIDAS
EN | "You make me laugh, Charlotte; but it is not sound (…)" P&P, chapter 6, pg 25
PT | "Fazes-me rir, Charlotte, mas nada disso faz sentido. " O&P, cap.6 , pg 16
BR | "Você me faz rir, Charlotte; mas a sua teoria não é sensata."O&P, cap.6 , pg 32
EN | "Mr. Darcy had at first scarcely allowed her to be pretty (…)" P&P, Chapter 6 pg 25
PT | "O senhor Darcy, a princípio, atribuíra-lhe pouca beleza." O&P, cap.6 , pg 17
BR | "A princípio, Mr. Darcy nem sequer tinha concordado com os que achavam que ela era bonita." O&P, cap.6 , pg 33
Nestas duas passagens acima transcritas, a tradução portuguesa fez mais sentido para mim.
EN | "The former was divided between admiration of the brilliancy which exercise had given to her complexion, and doubt as to the occasion's justifying her coming so far alone. The latter was thinking only of his breakfast." P&P, Chapter 7, pg 36
PT | "O primeiro estava dividido entre a admiração pela resplandecência que o exercício imprimira à sua tez e a dúvida sobre se o acontecido justificava a sua vinda de tão longe. O segundo pensava apenas no seu pequeno-almoço. " O&P, cap.7 , pg 23
BR | "O primeiro estava em dúvida sobre se devia admirar as belas cores que o exercício emprestara ao rosto da moça ou refletir que o motivo talvez não justificasse a sua vinda sozinha, de tão longe. O segundo pensava apenas no seu almoço." O&P, cap.7 , pg 44
"Breakfast" é em português de Portugal "pequeno-almoço" e em português do Brasil "café-da-manhã". Todo o parágrafo indica que seria de manhã cedo e que estariam a tomar a primeira refeição do dia. Não percebi o porquê da opção da tradução brasileira por referir esta refeição como "almoço".
EN | "You have a sweet room here, Mr. Bingley, and a charming prospect over the gravel walk." P&P, Chapter 9, pg 46
PT | "Tem aqui uma sala muito agradável, senhor Bingley, e com uma vista muito agradável para a calçada. " O&P, cap.9 , pg 28
BR | "O quarto em que ela está, Mr. Bingley, é muito agradável e tem uma encantadora vista sobre a aleia principal." O&P, cap.9 , pg 55
Neste trecho ambas as traduções tem seus altos e baixos. Logo na primeira parte da frase, a tradução portuguesa parece exprimir melhor a ideia: penso que Mrs. Bennet refere-se neste fala a sala onde está a ser recebida por Mr. Bingley e não sobre o quarto onde Jane está acomodada. Contudo, a tradução brasileira mostra-se mais adequada na parte final da frase ao traduzir ""gravel walk" como "aleia principal" já que o termo "calçada" parece-me ser uma expressão moderna e urbana (por isso, aos meus olhos, não muito adequada ao contexto rural).
PREFERÊNCIAS
EN | "She has nothing, in short, to recommend her, but being an excellent walker." P&P, Chapter 8, pg 39
PT | "Ela não tem, em suma, nada que a recomende, além do facto de ser uma óptima passeante. " O&P, cap.8 , pg 24
BR | "Nada tem, em suma, que a recomende, senão ser uma excelente andarilha." O&P, cap.8 , pg 47
Este foi um momento único para mim porque não gostei de nenhuma das opções nas duas traduções para a expressão "excellent walker". Acho que ambos foram um pouco literais e empobreceram um pouco a ideia. Não seria em situações desta que se poderia ter uma certa liberdade na tradução?
EN | "'Whatever I do is done in a hurry', replied he;' and therefore if I should resolve to quit Netherfield, I should probably be off in five minutes. At present, however, I consider myself as quite fixed here'." P&P, Chapter 9, pg 46
PT | "- O que quer que eu faça é sempre de um momento para o outro. - retorquiu ele. - E, portanto, se por acaso decidisse abandonar Netherfield, provavelmente partiria em cinco minutos. Contudo, de momento, encontro-me bastante estável aqui. " O&P, cap.9 , pg 28
BR | "-Tudo o que faço - replicou ele - é às pressas e, portanto, se resolvesse deixar Netherfield, eu o faria provavelmente em cinco minutos." O&P, cap.9 , pg 55
Apenas a destacar a supressão da última frase na tradução brasileira.
CONCLUSÕES:
Ainda é cedo para tirar conclusões profundas, mas a sensação que começo a ter com esta leitura comparada é que o nível de ambas traduções estão, até ao presente momento, muito equivalentes. O mesmo não aconteceu com a leitura comparada de Sense and Sensibility em que, no geral, apreciei mais a tradução brasileira feita por Ivo Barroso. A exceptuar um caso ou outro, o que tem prevalecido aos meus olhos é um baile de preferências. Ou seja, alguns momentos gosto da forma como a tradução portuguesa a descreve. Noutras prefiro a brasileira. Então, tem sido uma experiência equilibrada.
Quero voltar a reforçar de que não tenho qualquer pretensão de qualificar (ou desqualificar) qualquer uma das traduções. A intenção é apenas transcrever as dúvidas e apreciações do ponto de vista do leitor. No meu caso, uma leitora apaixonada por Jane Austen.
Para além do prazer de reler Orgulho e Preconceito e de fazer esta Leitura Comparada, há ainda o prazer de ver o resultado da leitura.
Se há algo que me faz sorrir é ver que Raquel chamou a atenção para detalhes que eu não vi e que despertaram em mim uma imensa vontade de ir correndo alcançar as traduções e rever os trechos. Chega a ser uma alegria infantil de redescoberta.
LEITURA COMPARADA DE "PRIDE AND PREJUDICE" DE JANE AUSTEN NAS SEGUINTES TRADUÇÕES:
"Orgulho e Preconceito" (Nuno Castro) E "Orgulho e Preconceito" (Lúcio Cardoso)
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PRIMEIRAS PALAVRAS
Inicio com a Raquel esta nova aventura pelas páginas de Pride and Prejudice. Acredito que serão dias de imensa alegria e deslumbramento. Porque será que Jane Austen tem esta capacidade perpétua de deslumbrar? Não sei explicar. Reler Pride and Prejudice é uma sensação de lar, de me sentir em casa. De alguma maneira a sua escrita abraça-me e diz-me quase num sussurro que sou bem-vinda. Uma sensação de que todos os personagens estão à porta com sorrisos e mãos estendidas. É uma sensação extremamente boa.
Esta leitura comparada não tem pretensões académicas ou segue um método rígido. Nem sequer tem como intensão apontar erros. Não sou tradutora, nem sequer tenho formação na área de estudo de literatura inglesa. Então, gostaria de deixar claro de que esta leitura comparada resulta de um acto de amor pela obra e por Jane Austen; bem como o destacar das particularidades do português de Portugal e do português do Brasil. Em tempos de afirmação do Acordo Ortográfico (sobre o qual eu desacordo), é para mim um grande prazer ainda ter matéria de comparação entre a língua portuguesa utilizada em ambos países. Há tanta beleza nesta diferença…
Como escrevi anteriormente, o resultado da leitura será publicado por mim e pela Raquel ao fim de cada mês. Abordaremos cinco capítulos de cada vez. Ao longo desta leitura comparada também procurarei abordar alguns temas que suscitam a minha atenção através de alguns trechos preferidos.
O INÍCIO
Para começo de conversa, transcrevo o primeiro parágrafo da obra e verão que não há grandes diferenças entre as duas traduções. É seguro afirmar que o início de Orgulho e Preconceito é dos mais emblemáticos:
EN | "It's a true universally acknowledged, that a man in possession of a good fortune must be in want of a wife" Pride and Prejudice, pg 2
PT | "É uma verdade universalmente aceite que um homem na posse de uma fortuna avultada necessita de uma esposa" Orgulho e Preconceito, cap. 1, pg 5
BR | "É uma verdade universalmente conhecida que um homem solteiro, possuidor de uma boa fortuna, deve estar necessitado de uma esposa" Orgulho e Preconceito, cap. 1, pg 9
Haverá alguém que fique indiferente a este parágrafo? Tomo a liberdade de dizer que esta afirmação prende o leitor por completo. Este e o parágrafo seguinte sempre me fazem lembrar um estilo meio teatral, algo meio ao estilo Shakespeare. Imagino sempre um narrador, em cima de um palco, a declamar: "Senhoras e senhores, é uma verdade universalmente conhecida…" e, de seguida, surge o primeiro acto em que Mrs. Bennet e Mr. Bennet entram com o deliciosamente divertido diálogo sobre o novo vizinho, Mr. Bingley.
Dizer "é uma verdade universalmente conhecida" (opção de Lúcio Cardoso) é a opção mais usualmente utilizada. Mesmo no contexto de conversação é uma expressão usada correntemente. Nesta primeira frase, Jane Austen deixa bem claro um dos assuntos mais presente no livro: o casamento.
DIFERENÇAS
EN | "You take delight in vexing me. You have no compassion for my poor nerves." Pride and Prejudice, cap. 2, pg 4
PT | "O senhor tem prazer em arreliar-me. Não tem qualquer compaixão pelos meus pobres nervos." Orgulho e Preconceito, cap. 2, pg 6
BR | "Você se compraz em aborrecer-me; não tem nenhuma pena dos meus pobres nervos." Orgulho e Preconceito, cap. 2, pg 11
Ambas as traduções seguem o sentido da expressão original, mas agrada-me que cada tradutor tenha utilizado um termo tão típico da sua nacionalidade. Em Portugal, o termo "arreliar" é corrente e acho que cai como uma luva na fala de Mrs. Bennet.
EN | "(…)and already had Mrs. Bennet planned the courses that were to do credit to her housekeeping, when a answer arrived wich deferred it all" Pride and Prejudice, cap.3, pg 10
PT |"E já a senhora Bennet tinha planeado os pratos que comprovariam os seus dotes de boa dona de casa, quando chegou uma resposta que deitou por terra todos os seus planos." Orgulho e Preconceito, cap. 3, pg 9
BR| "Mrs. Bennet já tinha planejado os pratos à altura da fama da sua cozinha quando chegou uma resposta adiando tudo." Orgulho e Preconceito, cap. 3, pg 16
Neste trecho, encontro-me diante desta dúvida. Parece-me que "to do credit to her housekeeping" parece-me estar relacionado com a capacidade de governar bem uma casa, mais do que a qualidade da cozinha ou das refeições confeccionadas. O que faria com que a tradução portuguesa, neste aspecto, estivesse mais em consonância com o original. Contudo, a frase também indica que Mrs. Bennet estaria centrada em conceber os pratos a serem servidos, o que talvez explicasse o sentido ressaltado pela tradução brasileira, mais centrada na notoriedade dos jantares servidos por Mrs. Bennet. Na segunda parte da frase, destaco apenas a expressão "deitou por terra" por ser uma expressão bastante utilizada em Portugal.
EN | "Mr. Bingley was good-looking and gentlemanlike; he had a pleasant countenance, and easy, unaffected manners" Pride and Prejudice, cap. 3 pg 10
PT | "O senhor Bingley era bem parecido e tinha um ar distinto, além de um semblante agradável e modos simples e francos." Orgulho e Preconceito, cap. 3, pg 9
BR| "Mr. Bingley era simpático e fino de maneiras. A sua aparência era agradável, os gestos, sem afetação" Orgulho e Preconceito, cap. 3, pg 17
O que eu gosto mais neste trecho é o destaque entre as diferenças do uso da língua em ambos países, principalmente na sua apropriação social e coloquial. Aparentemente, se alguém ler "good-looking" dirá que a tradução portuguesa estaria mais adequada isto porque traduz "bem parecido", o que destaca o aspecto físico de Mr. Bingley. Ou seja, ele seria bonito. Enquanto que traduzir "good-looking" como "simpático" poderia parecer errado porque a simpatia tem a ver com o lado qualitativo do carácter, algo ligado mais aos sentimentos do que ao aspecto físico. Contudo, dizer "simpático" no Brasil pode estar ligado ao físico. É natural dizer que alguém é "simpático" no sentido de ser "bem parecido", alguém agradável à vista. Mais uma vez, não estou a colocar em causa nem justificar as opções dos tradutores, mas ao ler este trecho foi esta a interpretação que fiz do mesmo. Já que inúmeras vezes, lembro de aplicar o termo simpático da mesma maneira.
DÚVIDA
Reli esta frase várias vezes e confesso que fiquei extremamente confusa... Não vos parece que ambas dizem algo totalmente diferente entre si?
EN | "Lady Lucas was a very good kind of woman, not too clever to be a valuable neighbour to Mrs. Bennet." Pride and Prejudice, cap. 5, pg 19
PT |"Lady Lucas era uma mulher muito amável, mas não suficientemente inteligente para ser considerada uma vizinha preciosa para a senhora Bennet." Orgulho e Preconceito, cap. 5, pg 13
BR| "Lady Lucas era uma mulher de bons sentimentos cuja inteligência não era demasiado brilhante para impedir que fosse uma vizinha preciosa para Mrs. Bennet." Orgulho e Preconceito, cap. 5, pg 26
De tal forma causou-me dúvida, que tive curiosidade em verificar nas outras traduções que tenho de Orgulho e Preconceito como o mesmo trecho foi traduzido. Gostei muito da opção feita pela tradução de José da Natividade Gaspar, na edição da Civilização Editora:
"Lady Lucas era uma senhora amabilíssima, embora não arguta bastante para que Mrs. Bennet a considerasse vizinha de grande valia", Orgulho e Preconceito, pág. 17
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Nestes cinco capítulos, Jane Austen apresenta o núcleo da família Bennet, alguns habitantes da localidade e os novos vizinhos que vem habitar Netherfield. E nisto vemos a subtileza da escritora ao desenhar a personalidade de cada um.
Anseio por continuar (a reviver) a observação dos personagens e também o percurso do trabalho de ambos os tradutores. Mal posso esperar...
Ao longo dos meses, constatei que um dos momentos emocionantes é ver o resultado da leitura efectuada pela Raquel. O mais curioso, para mim, é averiguar que duas facetas opostas tornaram-se viciantes: ver as dúvidas que tivemos em comum e, por outro lado, ver os trechos que ela destacou e que eu não me dei conta na minha leitura. O primeiro aspecto, porque as dúvidas em comum criam de certa um elo de pensamento. O segundo aspecto, faz-me pensar de imediato: "como eu não vi isto?"; e, este segundo aspecto em específico, faz-me voltar aos dois livros e acompanhar a Raquel nesta viagem das duas traduções. Esta é uma das partes construtivas de todo este processo.
Por isso, sigam o link e confiram o resultado da leitura da Raquel através dos textos:
Para quem não acompanhou este percurso desde o início, poderá fazê-lo. Deixo-vos a lista completa da programação de leitura da Raquel e os respectivos textos:
Ainda dentro do clima de comemoração, toda a próxima semana será dedicada a Sense and Sensibility no Jane Austen em Português.
A Raquel irá focar toda a atenção no lançamento da edição ilustrada de Razão e Sentimento da Editora Nova Fronteira. E, dentro deste contexto, iremos proceder a partilha da terceira e última parte da Leitura Comparada que desenvolvemos no âmbito do Bicentenário de Sensibilidade e Bom Senso.
Será uma semana marcada pela sensatez de Elinor e pela paixão de Marianne em tons de delicadeza e emoção.
Os mais atentos terão notado que no Desafio do Bicentenário da Leitura Comparada de "Sense and Sensibility" de Jane Austen nas traduções: “Sensibilidade e Bom Senso” (Maria Luísa Ferreira da Costa) e “Razão e Sentimento” (Ivo Barroso) - feita pela Raquel Sallaberry e por mim - ainda falta uma terceira parte para a sua conclusão.
A Leitura Comparada passou por uma pausa. A vida está submetida a um imperativo de imprevisibilidade e levou-nos a caminhar por outras paragens. Durante algum tempo, nós duas - cada uma no seu respectivo lado do oceano - envolvemo-nos em outras actividades e ocupações; mas, agora retomamos o rumo.
A nossa querida Raquel Salaberry, do Jane Austen em Português, abraçou um projecto que fará a felicidade de todas a Janeites: uma edição de luxo, de capa dura, ilustrada de Razão e Sentimento, tradução de Ivo Barroso (Editora Nova Fronteira). A própria Raquel escreve no livro "a história da composição do livro" - refere o poeta e tradutor Ivo Barroso no seu blogue.
Diante da importância deste lançamento, decidimos esperar pela sua concretização para publicarmos a terceira parte da Leitura Comparada. Temos esperança que seja em breve; por isso, estejam atentos!
Deixo-vos a imagem da capa do livro. Linda e delicada.
Lendo Sense and Sensibility no Brasil 200 anos depois – parte II
Alcançada esta Segunda Etapa da Leitura Comparada de Sense and Sensibility de Jane Austen nas traduções Sensibilidade e Bom Senso (Maria Luísa Ferreira da Costa) e Razão e Sentimento (Ivo Barroso), partilho convosco o olhar da Raquel Sallaberry sobre estes capítulos que está publicado no Lendo Jane Austen:
Leitura Comparada de Sense and Sensibility de Jane Austen nas traduções:
“Sensibilidade e Bom Senso” (Maria Luísa Ferreira da Costa) e “Razão e Sentimento” (Ivo Barroso)
S&BS| Viu - depois de um curto silêncio, continuou - mais alguma vez Mr. Willoughby desde que deixou Barton?
- Sim, vi - replicou gravemente - uma vez. Um encontro era inevitável.
Elinor, espantada pelos seus modos, olho-o ansiosamente, dizendo:
- O quê? Encontrou-o para...
- Não podia encontrá-lo para outro fim. Eliza confessou-me com muita relutância o nome do seu amante; e quando ele regressou para a cidade, o que aconteceu quinze dias depois da minha vinda, marcámos um encontro, para ele se defender e para eu provar a sua conduta. Separámo-nos sem ressentimentos e portanto o encontro nunca se espalhou.
Elinor suspirou e duvidou da necessidade daquilo, mas ele era um homem e um soldado, e não se atreveu a censurá-lo.
Capítulo 31, pg. 157
R&S| O senhor voltou a ver - perguntou ela a Brandon, após um breve silêncio - o sr. Willoughby, depois que deixou Barton?
- Voltei - replicou o Coronel gravemente - Uma única vez. Um encontro era inevitável.
Elinor, espantada pelos seus modos, olhou para ele ansiosa, perguntando:
- Como? Bateram-se em duelo?
- Não havia outra solução. Eliza, embora com relutância, confessou-me o nome de seu amante; e, quando ele regressou a Londres, uns quinze dias depois de minha chegada, marcamos um encontro, ele para defender sua conduta, eu para castigá-la. Nenhum de nós saiu ferido, e o duelo nunca chegou a ter repercussão.
Elinor suspirou e duvidou da necessidade daquilo; mas presumiu que a um homem e soldado nada devia censurar.
Capítulo 31, Pg. 149
Para mim foi uma grande surpresa descobrir que existiu um duelo em Sense and Sensibility. Terei sido a única a ficar espantada com tal informação? Eu li Sensibilidade e Bom Senso nos anos 90 e só quando eu assisti - uma década depois - a série da BBC "Sensibilidade e Bom Senso | 2008" é que dei-me conta desta questão do duelo. Alías, quando eu ví a série pensei que teria sido uma liberdade de argumento e tive curiosidade de pesquisar na internet sobre isto. O meu espanto foi grande.
Na tradução portuguesa, não é identificado o encontro que Coronel Brandon relata como um duelo. Confesso, nunca chegaria a esta conclusão. A ideia que eu fiquei é que teria sido um encontro em que falaram, quando muito, discutiram. Em Razão e Sentimento, vem traduzido como tendo acontecido um duelo. Devo dizer que, eu gosto da opção da versão brasileira. Ao ser identificado o "meeting" como um duelo, a imagem do Coronel Brandon ganha outra nuance. Acho que confere-lhe um ar mais participativo e, porque não dizer, másculo. Imaginá-lo a defender a honra de Eliza, colocando Willoughby no seu devido lugar (que é o de canalha) torna-o ainda mais elevado do que ele é.
Devemos admitir que a tradução brasileira foi ousada porque, no original, Jane Austen não utiliza o termo "duel". Naquele tempo os duelos seriam um tipo de ajuste de contas ilegal. Aliás, bater-se em duelo, fazia com que muitos homens partissem do país com medo das represálias judiciais. Então, Jane Austen toca ao de leve na questão, deixa subentendido. Através da reacção de Elinor, de entender que seria algo que um homem faria, mas que ela particularmente não aprovaria, demonstra que esta prática além de ser ilegal seria também socialmente pouco aprovada. E os duelos não durariam para além do tempo da Regência.
Esta questão ultrapassa o aspecto das traduções, mas não vos impressiona que ambos tenham saído ilesos do duelo. Como, sendo o coronel um homem de armas e experiente, não tenha feito dano a Willoughby? Terá sido um acto de misericórdia do Coronel Brandon que, após ter vencido Willoughby, preferiu poupar-lhe a vida? Eu gosto de pensar nesta possibilidade: Coronel Brandon - um verdadeiro cavalheiro.