Deixo ao vosso critério a escolha do termo mais adequado para classificar os nossos queridos "bad boys". Digo "queridos" porque sei que nem todas amarão Henry e nem todas odiarão John como eu. Por isso, resguardo o direito inalienável de cada leitor de amar e de odiar quem bem quiser.
De forma que pesquisei alguns adjectivos que servem para classificar um legítimo "bad boy" e passo a referi-los: malvado, má rês, mal comportado, matreiro, biltre, maroto, velhaco, patife, trapaceiro, melquetrefe/mequetrefe, perverso, facínora, vil, desprezível, ignóbil, reles.
A lista poderia ser maior mas acho que é suficiente. Quando penso em Henry Crawford, a expressão que mais salta à (minha) vista é "ah meu menino maroto!". Já com John Willoughby é "seu melquetrefe!". A minha escolha, apesar do esforço para não ser judiciosa, revela a minha parcialidade e pensamento. Mas esta exposição de termos e de expressões tem como foco a afirmação que um "bad boy" é bem mais intrincado do que parece.
O meu maior desafio ao escrever um texto que confronte Henry Crawford a John Willoughby é o de não ser judiciosa. Não quero prender-me a juízos de valor. O interessante deste exercício de comparação é equiparar virtudes e defeitos no sentido de encontrar semelhanças e disparidades.
Imparcialidade é uma utopia que eu não abraço quando falo de personagens de que amo. E, é facto, eu amo Henry Crawford. Na mesma medida, tenho um profundo desprezo por Willoughby. Quando falamos de personagens assim, cujo os percursos os transformam em seres sombrios, é natural que tenhamos a tendência de amar ou de odiar.
É o que acontece com os "Bad boys". Meninos malvados. Rapazes de má rês. Velhacos! - se quisermos usar uma expressão à moda antiga. As vozes de sabedoria alertam-nos, desde cedo, para fugirmos a sete pés de rapazes assim, de carácter e conduta duvidosa com o risco de cairmos em declínio e de sucumbirmos aos encantos de alguém que pode nos conduzir à auto-destruição. Mas a verdade, em alguma altura da vida, sempre tivemos simpatia por um rapaz assim.
Nem todos os "bad boys" são maléficos. Nem todos têm como objectivo fundamental serem vilões. E, nem todos os "bad boys", querem causar danos. Mas, certo é, que o fazem; muitos causam danos irreversíveis. Por que, essencialmente, com mais ou menos virtudes, com mais ou menos defeitos, com mais ou menos infortúnios, o que parece ser constante a todos o "bad boys" são duas características: o egoísmo e a fraqueza. Estas são as duas brechas que entorpecem-lhes o carácter, moldam-lhes as acções e conduzem, em última instância, a uma existência menor. Como se a sua própria maneira de ser fosse, em si mesma, um destino ao qual não conseguem fugir.
Tendo como base estas ideias, irei falar nos posts seguintes sobre as características que distanciam Crawford e Willoughby e também abordar um pouco sobre o papel de Fanny e de Marianne dentro desta dicotomia.
No último Clube de Leitura Jane Austen, da Bertrand, em Lisboa, o livro em discussão foi "Persuasão. No final ficou em aberto uma questão que se prendia com o significado da expressão "virtudes domésticas" que consta do último parágrafo do livro. Comprometi-me com as colegas do Clube, a Ana Saraiva, a Maria Fernanda e a Susana Lopes Bastos, em verificar e partilhar a minha opinião sobre o assunto. Entretanto, a Susana Lopes Bastos, deixou-me a sua reflexão sobre o assunto. Achei que era de grande interesse partilhá-la. Por isso, o texto que aqui vos deixo é da autoria da Susana Lopes Bastos.
(...) quanto às "virtudes domésticas", penso que terá que ver com a admiração que a Jane Austen nutria pela marinha. Ela própria teve dois irmãos que chegaram a almirantes e como excelente observadora da sociedade do seu tempo traçou-nos, e no Persuasion isso é muito evidente, retratos dos vários tipos de extractos sociais que poderiam dominar social e politicamente o país naquele tempo e nota-se que, dos três grupos retratados em Persuasion que poderiam ter um papel de liderança e de governo do país, ela preferia nitidamente as famílias ligadas à marinha. Nos aristocratas, com berço e linhagem mas com vidas vazias, sem qualquer contacto com a realidade das populações, inúteis, vaidosos, muito fechados no seu próprio círculo, demasiado preocupados com as aparências e extravagantes, não se pode confiar para continuarem a ser os líderes das suas próprias comunidades como tinham sido tradicionalmente até ali. Depois há o outro grupo, de pessoas não nobres mas "de bem", os cavalheiros e as suas famílias, muitas delas bem antigas, tradicionais, ricos, mas demasiado conservadores. No caso de Persuasion, Anne prefere os Musgroves à sua própria família, porque embora não sejam muito elegantes nem muito cultos são cordiais, despretensiosos e têm bom coração. No entanto considera-os incapazes de governar o país no sentido de o modernizar e de o preparar para o futuro (nem os seus filhos considera capazes disso porque embora com modos e pensamentos mais modernos, não têm peso, não são influentes). Ela prefere, por isso, as famílias ligadas à marinha, para levar o país para o futuro. Considera-os melhor preparados pela sua integridade, lealdade, pela bravura demonstrada em combate, pelo seu vigor, pelos seus valores. Nas últimas linhas de Persuasion Jane Austen traça o retrato do papel da marinha na sociedade inglesa. Reconhece que o futuro da Anne poderá não ser inteiramente feliz, sempre com o receio de uma nova guerra e das possíveis separações prolongadas do seu marido. Esse é o preço a pagar por ser mulher de um oficial da marinha e apesar dos riscos ela exultava em ser mulher de um oficial da marinha. Há quem considere este livro muito auto-biográfico e aqui eu penso que a Jane Austen, enquanto fala da Anne, nos dá a sua própria opinião sobre os marinheiros e depois escreve mesmo, enquanto autora, que eles eram (para ela), se possível, ainda mais importantes internamente enquanto membros da sociedade do que no seu papel de defensores da nação e nos serviços que lhe prestavam, a essa nação, no exterior. Ao longo do livro, embora refira alguns personagens como sendo oficiais da marinha ela não nos diz o que eles fazem enquanto membros da profissão. A sua função na narrativa era apercebermo-nos de como os membros da marinha eram bem vistos pela sociedade civil. E por não lhes ter dado mais importância do que isso ao longo do livro, ela reconhece, nas últimas linhas, o papel fundamental da marinha, o bem que fazia pelo país, não só na sua defesa, na manutenção das suas fronteiras e das suas colónias mas também como meio de ascensão social e de conservaçãos dos valores ingleses. É uma forma dela honrar a marinha, considerando o trabalho árduo e a boa sorte uma forma honrosa de subir na sociedade e assim contribuir para uma sociedade mais forte, mais íntegra, mais plural, mais desenvolvida e mais moderna. E serão essas, na minha opinião, as suas "virtudes domésticas".
Se tiverem outras interpretações, partilhem.
Susana Lopes Bastos
Espero que tenham gostado e que, também por aqui, consigam acompanhar as discussões que vão tendo lugar no Clube de Leitura.
Obrigada pela excelente e sempre entusiasta participação, Susana! Bem-haja!
Já falta pouco para o dia 21 de Outubro e como o tempo começa a apertar é altura para rever as adaptações de Orgulho e Preconceito. Para aqueles que só agora nos encontraram, eu volto a explicar. No dia 21 deste mês, irá ter lugar mais uma sessão do clube de leitura Jane Austen, este clube surgiu de uma parceria entre o nosso blogue e a Livraria Bertrand, funciona em Lisboa, Porto e Coimbra.
A sessão do dia 21 será no Porto e claro falaremos das adaptações de Orgulho e Preconceito! O tempo não nos permite discutir a fundo todas as adaptações por isso mesmo iremos centrar a nossa conversa nas adaptações de 1995 e 2005, afinal estas são as mais conhecidas, mas iremos também falar um pouco sobre as outras, nomeadamente esta de 1980. Se ainda não se inscreveram no clube, basta irem aqui: Clube De Leitura
Se tiverem vontade de discutir algum aspecto das adaptações, podem deixar a vossa sugestão, nos comentários.
A Clara já analisou esta adaptação aqui ficam os links: