Shortstory – parte 58
E a primavera chegou finalmente naquele ano e com ela, os casamentos que se esperavam com tanta ansiedade. Como havia sido acordado entre todos, as cerimónias realizaram-se todas no Solar de Kellynch, ainda alugado pelo Almirante Croft a sir Walter Elliot.
Anne estava radiante e muito bela, tão feliz, finalmente casando com o seu amado Frederik Wentworth, que tudo o que ocorrera antes já parecia um sonho mau, cada vez mais afastado e apagado, desfazendo-se no tempo e tornando-se já coisa nenhuma.
Quanto ao próprio Frederik Wentworth, a sua felicidade era tão completa e a comunhão entre ambos tão plena, que já nem se incomodava com os disparates do sogro, que só falava em gente da nobreza, na beleza de algumas pessoas e na fealdade de muitas outras.
Wentworth pensou com algum humor, que quando falava dos outros, sir Walter Elliot não devia ter a noção da sua própria figura, agora um pouco atarracada, a barriga saliente, o rosto muito pálido devido à sua fobia pelo sol e os olhos meio afundados. Claro que não, sir Walter Elliot não se dava conta da sua aparência e da forma como parecia mesquinho e hipócrita, pouco ligando à filha, apossando-se de sir Thomas Bertram em todos os momentos, correndo atrás dele quando o via a conversar com outras pessoas.
Quanto a General Tilney e Lady Russell, ambos se encontravam muito conscientes dos seus papéis, mais humanos e sensíveis para com os outros e os seus problemas, deixando de ligar tanto às aparências e passando a estar mais atentos aos sentimentos.
Algum tempo atrás, após o rapto de Anne e a morte do louco Elliot, General Tilney descobrira que o seu caseiro em BlackThunder havia sido assassinado, supostamente pelo mesmo indivíduo que raptara Anne. Tinham sido maus momentos, pensou General Tilney, que se apressara a vender a propriedade por bom dinheiro.
Depois disso, aceitara que se fizesse o casamento da sua filha Eleanor Tilney com o seu amado de sempre, facto a que em tempos ele próprio se havia oposto com tanta veemência e que agora via com novos olhos. Os felizes recém-casados haviam viajado para a Irlanda, onde o noivo possuía propriedades vastas e um castelo.
Por isso, naquele dia, General Tilney e Lady Russell estavam acompanhados por Henry Tilney e Catherine que já fora Morland e Thorpe e agora era Tilney, sentindo-se uma heroína em pleno, ao casar-se no mesmo dia do sogro, subitamente tornado bom, e de Lady Russell, que sempre tomara por senhora distante e importante, agora transformada numa madrasta muito sensível e afetiva.
Georgiana sentia-se tranquila e feliz ao lado do seu amado William Price. Uma semana antes, tinham finalmente conversado sobre os seus planos com o irmão dela, Fitzwilliam Darcy. A ideia de ambos casarem e viajarem juntos pelo mundo era agora conhecida de Darcy e Lizzie que, aos poucos se estavam a acostumar a ela.
E assim, o casamento de Georgiana e William Price estava já marcado para o próximo mês em Pemberley, quando os primeiros sinais do verão já se estivessem timidamente a anunciar. Por isso, aquele era um momento de enorme felicidade para Georgiana, que desde que William lhe manifestara os seus sentimentos e partilhara com ela os seus projetos, já não pensava noutra coisa que não fosse o mundo tão grande que a rodeava e que ela agora iria conhecer, logo ela que nunca ia a lado nenhum! Desde então que Georgiana era assídua observadora de mapas, recebendo com assiduidade de uma livraria em Londres, as cartas náuticas e a literatura de viagens que eram agora os seus mais recentes interesses. Nem a possibilidade infeliz de enfrentar um mar tumultuoso ou tempestades ameaçadoras, sequer o que ouvia contar sobre as atividades dos corsários eram factos suficientes para a demover dos seus sonhos, agora cada vez mais próximos de serem reais. A própria Georgiana se espantava com a sua intrepidez e ousadia, pois nunca imaginara desejar tanto ausentar-se da sua querida Pemberley e querer tanto conhecer o mundo!
Quanto a Darcy e Elisabeth, após a revelação surpreendente de Georgiana e Willliam, que os haviam abalado no imediato, por não estarem a contar com uma mudança tão súbita, estavam agora a habituar-se à ideia da ausência de Georgiana, já que isso inexplicavelmente a parecia fazer tão feliz! E ali estavam Darcy e Elisabeth, acompanhados por Jane e Charles Bingley, todos felizes mas já com saudades dos gémeos que tinham ficado com as amas em segurança em Pemberley, afastados daquele bulício do convívio das pessoas e dos casamentos.
Emma, muito bela e luminosa, circulava por entre todos, sentindo-se muito feliz, agradecendo ao seu sexto sentido que sempre lhe indicara a possibilidade de união entre Anne e Wentworth. Tinha deixado o pai em casa em Hartfield, acompanhado pela filha mais velha, Isabella, pelo marido e pelos agora seis filhos, tendo todos vindo de Londres propositadamente para ficar com ele e libertar a querida Emma.
Mr. Woodhouse não se sentia bem em ambientes tão cheios de gente e continuava a afirmar que também Emma não gostava de se rodear de tantas pessoas nem de estar em tantas festas. Mas Emma estava encantada e sentia-se como peixe na água. Mr. Knightley seguia-a e tentava por vezes provocá-la com a conversa dos casamentos.
- Neste lugar está bem colocada para fazer mais casamentos, Emma… - disse ele – qual acha que será o próximo?
Emma sorriu daquela forma tão encantadora e superior que era a dela.
- O próximo casamento como sabe, Mr. Knightley, será o de Georgiana e William Price… mas esse é fácil, porque já está combinado! O outro casamento que se realizará de seguida e do qual os próprios ainda não tomaram conhecimento, é o de Fanny e Edmond Bertram… não vê como estão tão apaixonados e se entendem tão completamente?
Ambos olharam para Fanny e Edmond, tão embrenhados e mergulhados na conversa, que quase se esqueciam de falar com os outros. Perto deles encontrava-se sir Thomas Bertram e ao lado deste, inevitavelmente estava sir Walter Elliot a tentar meter conversa.
- Emma… - atreveu-se a dizer George Knightley – e a Emma, não casa?
Emma riu, sentindo-se ligeiramente perturbada.
- Ora essa, Mr. Knightley, agora está sempre a perguntar-me isso! Não se recorda que eu tenho dito sempre que não tenciono casar. Ser a senhora da casa de meu pai está muito bem…
Mr. Knightley ia para lhe responder, mas foram interrompidos por Elinor Ferrars e Marianne Brandon que anunciavam outra feliz notícia.
- Sabem que a nossa irmã, Margaret, está noiva de James Morland, o irmão de Catherine? Já falaram com a nossa mãe e é já uma coisa oficial… por isso teremos em breve ainda outro casamento! – anunciou Elinor.
E Marianne, com a impetuosidade de que nunca se libertara, perguntou:
- Que tem, Emma? Está tão corada!