Emma, a heroína que nunca vai a lugar nenhum
Todas as heroínas de Jane Austen, num momento do livro passam uma temporada fora de casa. As irmãs Dashwood visitam Londres na companhia da Mrs. Jennings e na volta para casa passam algumas semanas na propriedade dos Palmers, onde devido à doença de Marianne ficam mais tempo do que inicialmente previsto. Elizabeth visita os recém-casados Collins e mais tarde os tios proporcionam-lhe umas férias no Derbyshire, a sua irmã Jane passa algum tempo em Londres e Lydia vai para Brighton com os Forsters. Catherine acompanha os Allen a Bath e Anne Elliot antes de se mudar definitivamente para esta cidade passa algum tempo com a sua irmã Mary. Até mesmo a heroína mais pobre dos livros de Jane, Fanny Price, visita a sua família com quem fica durante alguns meses.
Emma é a única que nunca vai a lado nenhum, sim há o passeio a Box Hill, mas é somente um passeio que dura algumas horas e permite o regresso a casa no mesmo dia. Emma nunca vai passar algumas semanas com a irmã a Londres ou visitar qualquer outro lugar como Bath.
Sobre o ponto de vista narrativo Emma é um romance fechado todos os personagens que conhecemos no inicio estão lá no fim, não existe uma alteração significativa, o livro funciona como um circulo fechado. Noutras obras vão nos sendo apresentadas novas personagens, em Emma isso não acontece. Harriet Smith é introduzida no círculo de Emma, mas ela já vivia há algum tempo em Highbury e o mesmo é válido para Jane Fairfax e Frank Churchill, embora ausentes durante uma parte da obra estão presentes pelas várias menções que lhes são feitas. A única personagem realmente nova que conhecemos, a a Mrs. Elton, mas a sua presença é irrelevante excepto para irritar Emma e o leitor com toda a sua maneira de ser.
O curioso desta constatação é que Emma é de todas as heroínas a que mais teria possibilidades de viajar já que era a mais rica. Os motivos para a ausência de alguma viagem são facilmente explicados pelo pai que acha que ir ao jardim já pode causar uma constipação que o vai matar. Emma não pode e também não quer deixar o pai e por isso permanece em casa.
No entanto uma melhor explicação pode estar algures na sua correspondência de Jane Austen onde afirmou que o seu trabalho incidia sobre três ou quatro famílias da sociedade rural. Talvez por isso em Emma levou tal afirmou a sério e criou um leque pequeno de personagens e um espaço confinado que nunca é alterado ao longo do livro, mesmo quando Emma encontra o amor ela encontra-o em alguém que conheceu toda a sua vida.
No fundo é como Jane Austen tivesse decidido brincar com um cenário fixo e nele movimentar um conjunto de personagens.
Será Emma enquanto personagem limitada por esta falta de conhecimento do outros espaços que não Highbury? Pessoalmente acho que não e Emma seria a mesma pessoa ainda que tivesse feito a volta ao mundo. Na obra de Jane não observamos mudanças significativas nos personagens pela lugares que visitam. Por exemplo, Elizabeth Bennet descobre durante a sua estadia no Kent que Darcy está apaixonado por ela, que Wickham é um patife e a forma como Jane e Bingley foram separados. Mas a sua maneira de ser continua a mesma. Penso que Jane não via nas mudanças de ares uma forma de mudar o personagem ou até de corrompê-lo. Em algumas obras de outros autores observamos isso, um exemplo típico é o jovem mais inocente que ao vir para a cidade, após uma vida no campo é corrompido pela vida citadina.
Julgo que Jane Austen acreditava na mudança de opiniões quando a pessoa é exposta à verdade, como acontece com Elizabeth Bennet mas nunca a de mudança/ reforma da personalidade do qual Henry Crawford é um bom exemplo.
Todos estes factos e análises levam-me a pensar que Emma seria exactamente igual quer tivesse passado temporadas em Londres ou noutro sítio qualquer, embora a aí talvez tendo à sua disposição mais divertimentos e ocupações ela não estaria tão preocupada em arranjar casamentos ou talvez fosse mais aliciante para ela fazer isso uma vez que existiam mais homens e mulheres livres!!