Não é a primeira impressão que conta...
Há personagens com os quais temos uma conexão imediata e há outros que demoramos a compreender. Tenho que confessar de que tive algum problema em compreender Mrs. Dashwood na primeira vez que li "Sensibilidade e Bom Senso". A minha primeira interpretação dela foi a de uma mulher alienada. Alguém ausente da realidade. Uma mulher que não era capaz de administrar o seu próprio lar, tendo que ser a filha mais velha, Elinor, a fazê-lo. Uma mulher que permite que um estranho corteje a filha mais nova, que a engane e que não manifesta grande reacção enérgica diante disto tudo. Como fui cruel com Mrs. Dashwood! Quando voltei a reler "Sensibilidade e Bom Senso", principalmente ano passado a propósito do Bicentenário, passei a compreendê-la de outra maneira.
Mrs. Dashwood, senhora de si mesma, senhora de Norland e a viver com conforto e sem preocupações, perde o marido, foi desprovida de seus bens, do lugar que viu nascer suas filhas, passou pela humilhação de viver algum tempo submetida ao favor de um enteado frio e de sua mulher ainda mais fria e ambiciosa. Habituada a ter tudo, passou a ter nada. E, em meio a tudo isto, ainda tinha a dor da perda e da saudade. A fortuna de Mrs. Dashwood passou a ser unicamente as suas três filhas. Elinor, que ocupava-se de todas as questões práticas; Marianne, que a ouvia e entendia os seus sentimentos; e Margareth, que com sua vivacidade infantil alegrava os seus dias.
Imagino-a, muitas vezes, perdida nos seus próprios receios, devaneios e incertezas. Talvez por horas. Contudo, tenho que fazer justiça a Mrs. Dashwood: ela preocupava-se com as filhas. Principalmente no que dizia respeito aos assuntos do coração. Apesar de estar de luto, compreendeu as nuances do sentimento que surgia entre Elinor e Edward, preservou a dignidade da filha ao retirá-la de Norland, incentivava que elas tivessem convívio social e incentivou o romance entre Marianne e Willoughby. É certo que, neste último caso, deixou-se levar pelo seu romantismo em detrimento da prudência exigida. E que angústia terá sido receber a notícia de que a sua filha querida, tão parecida consigo mesma, tão sofrida de um amor frustrado estar em perigo de sucumbir diante de uma doença.
Vejo, agora, Mrs. Dashwood como uma mãe querida, carinhosa e compreensiva. Alguém que sonhava para as filhas um futuro seguro mas acompanhado de um casamento criado por um sentimento e não por uma imposição. Alguém que desejava para as filhas toda a felicidade do mundo. Uma mãe que coloca o seu amor pelas filhas, acima do seu próprio bem-estar e comodidade, é uma verdadeira mãe.
Por tudo isto, tenho que pedir-lhe perdão, Mrs. Dashwood, pelas minhas "primeiras impressões" erróneas!