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Jane Austen Portugal

O Blogue de Portugal dedicado à Escritora

Lady Bertram e Mrs Norris - as irmãs

"É um facto provado não haver no mundo tantos homens ricos como mulheres bonitas que os mereçam."

Jane Austen in "O Parque de Mansfield"

 

Lady Bertram, Mrs Norris e Mrs Price são três irmãs que opondo-se umas às outras são, em elevado grau, também muito semelhantes entre si. Mrs Norris e Mrs Price, a mais velha e a mais nova, respectivamente, conjugam, no início da narrativa, na frontalidade que caracteriza as suas personalidades explosivas. Já Lady Bertram, a do meio, se parece mais com Mrs Price na indolência, desorganização e negligência no que aos assuntos domésticos diz respeito. Esta é, contudo, uma percepção que temos já quase no final da narrativa uma vez que inicialmente Mrs Price é caracterizada com atrás foi dito.

 

Jane Austen escreve que "Lady Bertram, a irmã do meio, Maria Ward, de Huntingdon, em solteira, tinha apenas sete mil libras de rendimento. A sorte, porém, favoreceu-a, pois os seus encantos seduziram Sir Tomás Bertram, do Parque de Mansfield, no condado de Northampton. E Maria Ward foi assim elevada à categoria de esposa de um barão, passando a gozar de um conforto e a consideração que concedem os bons rendimentos de uma casa rica." Descreve-a ainda como sendo "senhora de génio pacífico, temperamento conciliador e indolente".

 

Ao longo da narrativa deparamo-nos com uma personagem que em vez de assumir um papel de destaque em sua casa, o Parque de Mansfield, se apaga a favor da irmã, Mrs Norris, que tudo controla. Tal aspecto é evidenciado aquando da ausência de Sir Tomás Bertram.

 

Por outro lado, existe a dependência crónica e aguda de Lady Bertram em relação à sobrinha Fanny Price. Não passa sem os seus préstimos um instante que seja, usando-a quase como escrava de serviço a tempo inteiro. Depois de Fanny será Susan a servi-la confirmando o seu egoísmo e a sua insegurança.

 

No despoletar das crises que assolam o Parque de Mansfield, Lady Bertram praticamente desaparece. Poder-se-ia pensar, à medida que a estória evolui, e adivinhando todas as situações, que a mulher de Sir Tomás Bertram se iria revelar como sendo uma pessoa forte capaz de apoiar o marido e os filhos. Mas o contrário sucede como que martelando majestosamente a sua personalidade inicialmente apresentada de forma a vincá-la ainda com mais precisão. Se Sir Tomás Bertram se encantou com a sua beleza, mais tarde ter-se-á arrependido por ter escolhido uma mulher tão submissa e apagada. Esta ao invés de ser um sopro de ar fresco e uma muralha de apoio na vido do marido é apenas mais um peso e mais um preocupação. É sem dúvida alguma a personagem menos interessante de toda a narrativa.

 

Já Mrs Norris, é um vulcão que transborda problemas. Mulher de Mr. Norris, seu segundo marido em virtude do falecimento do primeiro, um reverendo de pouca fortuna conhecido de seu cunhado. Talvez porque não tivesse as mesmas condições que a irmã que a sucedia, esta era mais metódica na governação da casa, não sendo perdulária, a ponto de avançar sempre com sugestões que depois de aceites deixava ao encargo de seu cunhado. Tudo o que incluísse despesas e aborrecimentos ou preocupações era dirigido com veleidade para o barão do Parque de Mansfield.

 

Por outro lado, era fútil e oca na avaliação dos demais, chegando a ser cruel pelo pequeno prazer que tal lhe concedia, principalmente com Fanny Price. Adulava as outras sobrinhas, principalmente Mary, a sua favorita, a ponto de as estragar com ideias tolas e ocas que mais tarde se reflectem nos seus comportamentos e na forma desastrosa como guiarão as suas vidas. Não obstante, Mrs Norris fica ao lado de Mary, tomando então consciência dos seus actos e da sua influência sobre a sobrinha. "Estava completamente mudada: sossegada, inconsciente, indiferente a tudo quanto se passava. Já não se importava de ficar sozinha com a irmã e o sobrinho, a cuidar da casa. Sentia-se incapaz de dirigir e de dar ordens, ou até mesmo de se imaginar útil. Quando estava realmente aflita, a sua actividade entorpecia-se, e nem Lady Bertram nem Tom tinham recebido dela o menor auxílio." Mas a sua mudança é passageira, já que a sua crueldade se volta imediatamente a manifestar aquando do retorno de Fanny ao Parque de Mansfield. Escreve a autora que "Mrs Norris em vez de se sentir consolada com a chegada deles (Edmundo, Fanny e Susana), ficou ainda mais irritada ao ver a pessoa que, na cegueira da sua ira, ela considerava como um demónio": Fanny Price. "Susana era também uma afronta. Apenas lhe lançou alguns olhares repulsivos, e viu logo nela uma espia, uma intrusa, uma sobrinha indifereent, e muitas outras coisas odiosas."

 

Em suma, a passividade excessiva de Lady Bertram contribuiu e reforçou a má influência de Mrs Norris, cuja personalidade não se caracterizava pela amabilidade, civilidade, empatia, justiça e responsabilidade. Tivesse Lady Bertram assumido o seu papel e muitas desgraças cairiam longe do Parque de Mansfield.

 

Edward Ferrars

 

1º de tudo o Edward é uma personagem que eu gosto bastante, apesar da minha dualidade de sentimentos como já vão reparar pela minha análise. No que toca a adaptações eu acho mesmo que o Hugh Grant foi mesmo perfeito como Edward Ferrars. Apesar de gostar de Edward porque no fundo ele consegui fazer frente a todos por amor, não deixa de ser, na minha opinião um homem um pouco fraco, apenas decidido em fazer a sua mãe feliz e seguir o plano que ela tem traçado para ele. Ao mesmo tempo que se apresenta "obediente" à sua mãe e irmã, comete uma "ilegalidade" e nas costas destas fica noivo de Lucy, mesmo sabendo que a sua família está inteiramente contra esse cenário.Talvez o noivado seja uma forma de escape e revolta contra as regras ditadas pela sua família, no que diz respeito ao seu futuro pessoal e monetário.

Apesar de amar Elinor, Edward mantém a sua promessa de casamento com Lucy, o que reflecte um homem integro e com valores que pensa nos outros em deterimento dos seus sentimentos. No final talvez se terá apercebido de que ao "abafar" os seus sentimentos por Elinor, está também a ferir os sentimentos da mulher que ama. No entanto, mesmo no momento em que finalmente fala dos seus sentimentos a Elinor, eles são escassos e deixam Elinor um pouco confusa à espera de um pedido, que não vem logo... No fundo apesar de ser um homem passivo, é um homem apaixonado, sensível e com bons principios morais e como tal, merece todo o meu respeito.

DESAFIO | Bicentenário "Sense and Sensibility" #36

- Sensibilidade e Bom Senso (2008) | 13 -

-  cenas marcantes #2 –

 

 


 

Edward procura Elinor na Biblioteca. Isto acontece quando as Dashwood estão a arrumar os seus pertences e a preparar a partida de Norland. Esta é uma das cenas que eu considero perfeita nesta mini-série. Edward procura Elinor para se despedir dela. Ele não sabe muito bem como agir; meio constrangido, meio hesitante. Lemos em seus gestos o desejo de lhe revelar e de falar livremente sobre o que sente e sobre o que o retém. Ela, por seu lado, está expectante por uma declaração de sentimentos por parte dele. Hattie/Elinor parece que respira com dificuldade na ansiedade de ouvir-lhe as palavras esperadas. Os seus olhos estão fixos e brilham. Edward olha para todos os lados, não sabe que palavras usar e, por fim, entrega-lhe um livro de presente. Ele sai da biblioteca como quem foge de si mesmo. Elinor fica estática, estupefacta e surpresa. 

 

 

 


 

DESAFIO | Bicentenário "Sense and Sensibility" #35

- Sensibilidade e Bom Senso (2008) | 12 -

-  Dan Stevens e a Reconciliação #2 –

 

 

Dan Stevens inicialmente apresenta-nos um lado tímido aliado à um certo ar de humor. É o irmão mais velho de Fanny que mostra, desde o início, o quão diferente é desta e, por consequência, da restante família. Ele revela-se despretensioso e reservado. Tudo nele é calma e simplicidade.

Conforme a história se desenvolve também verificamos a evolução que Dan Stevens confere ao personagem: a tranquilidade o abandona. Quando Mrs. Dashwood anuncia que ela e as filhas irão partir de Norland, a serenidade de gestos é substituída por frustração e também – à semelhança de Hattie/Elinor – uma postura de contenção. Frustração, contenção e hesitação. Parece que lemos em seus olhos: “o que vou fazer agora?”. Ele quer revelar o seu sentimento mas, ao mesmo tempo, tem que manter a sua palavra e o segredo. Há sofrimento e alguma revolta em todo este processo de contenção e de frustração.

Em tudo isto, Dan Stevens transporta-nos para dentro do coração de Edward. Revela-nos a sua angústia. Revela-nos a sua integridade. Revela-nos, inclusive, o quão semelhante ele é de Elinor: ambos sabem guardar um sentimento, respeitar um segredo e cumprir a palavra dada. Ambos têm capacidade de contenção, de sofrimento e de sacrifício.

Eu afirmei, no post anterior, que Dan Stevens selou o meu processo de reconciliação com Edward Ferrars. Para além de tudo o que tenho deduzido sobre Edward, ao longo dos anos e de muitas releituras, esta interpretação deu voz activa ao personagem e fez-me entender a dimensão de sofrimento de Edward. O resultado do trabalho feito em Sensibilidade e Bom Senso 2008 é, no fundo, resultado de uma dupla interpretação: do argumentista e do actor. Agradou-me esta dupla leitura. Agradou-me este Edward profundamente angustiado e em conflito com as suas próprias convicções. Sobretudo, agradou-me ver um Edward com um ar indiscutivelmente apaixonado.

 

Por tudo isto, acho que Dan Stevens – com a sua interpretação de Edward Ferrars – é o grande homem desta mini-série. 

 

 

 

 

 

DESAFIO | Bicentenário "Sense and Sensibility" #34

- Sensibilidade e Bom Senso (2008) | 11 -

-  Dan Stevens e a Reconciliação #1 –

 

 

 Em Sensibilidade e Bom Senso, Jane Austen escreve que Edward Ferrars: 

“Não era bonito e os seus modos necessitavam de intimidade para se tornarem agradáveis. Era muito inseguro para fazer justiça a si próprio, mas quando vencia a timidez natural todo o seu comportamento mostrava que possuía um coração terno e bom. A educação dera solidez à sua inteligência.”

 

Em Sensibilidade e Bom Senso 2008, Edward Ferrars surge na história de maneira inusitada: ele chega no momento em Elinor está a bater os tapetes que Fanny teria mandado as empregadas limparem. Ele a cumprimenta com um tom brincalhão e bem-humorado. Sobre a chegada deste personagem o livro não revela muito e apenas diz o seguinte: “um jovem simpático e de boa aparência que lhes foi apresentado pouco depois da vinda de sua irmã para Norland”. Ao ver esta cena, fica-se com uma primeira impressão totalmente oposta àquela concebida por Jane já que ele não demonstra muita timidez. Por outro lado,  também - temos que admitir - que o Edward Ferrars desta versão afasta-se do livro relativamente à aparência, já que é extremamente belo.

 

Apesar de tudo isto, eu adoro esta cena e também toda a interpretação de Dan Stevens. Esta cena cria de imediato uma química entre o casal Edward/Elinor. Embora pareça inicialmente que este Edward possa vir a ser alguém distante do original, acabo por pensar justamente o oposto. A timidez e a insegurança que são características da personalidade de Edward revelam-se gradualmente.  O tom de voz, a sua postura corporal, os seus gestos, tudo isto denota uma maneira de ser pausada, tranquila e recatada. Um Edward Ferrars que não gosta de ser o centro das atenções, ou como diria Jane: “não tinha queda para grandes  homens nem para grandes carruagens. Todos os seus desejos se centralizam no conforto  doméstico e na calma da vida familiar”.


Edward/Dan passa-nos uma serenidade que adivinhamos na personagem criada por Jane Austen. O que me impressiona é que ele consegue conjugar todo este lado da timidez com um certo humor.

 

Devo dizer que Dan Stevens é outro actor que eu não conhecia até ver esta mini-série, e surpreendeu-me. Devo dizer que, junto com Hattie Morahan, é uma das interpretações de que eu mais gosto nesta produção. Aliás, ambos (Dan Stevens e Hattie Morahan) fizeram um casal extremamente convincente e apaixonante.

 

A prestação de Dan Stevens impressiou-me e veio selar o meu processo de reconciliação com Edward Ferrars.