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Jane Austen Portugal

O Blogue de Portugal dedicado à Escritora

Julia Bertram

 

Julia Bertram é a segunda filha e a mais nova das quatro crianças Bertram. Julia tem melhor temperamento que a irmã, o seu carácter é mais controlável e não tem tanto falso orgulho como a irmã.

Jane Austen não é tão severa com ela como é com a irmã Maria, embora ambas sigam caminhos semelhantes, no entanto, à última da hora, Jane Austen está disposta a resgatar Julia, depois da sua louca escapadela com Mr. Yates (o que não faz com Maria, que vai viver retirada com a sua tia Norris, uma condenação insuportável, diria eu!).

 

Tom, Maria, Edmund e Julia, sofreram da grande ausência do seu pai e da presença indiferente da mãe. Em relação a Maria e Julia, elas não têm nenhum modelo, nenhum exemplo de valores e principios vindos de uma figura feminina - a mãe é indiferente à sua educação, a única presença que têm é a de uma tia (Mrs. Norris) que, na minha opinião, as influencia negativamente, atribuindo-lhes uma importância exagerada e desproporcionada. O pai, Sir Thomas, é um homem íntegro, uma personagem que respeito muito e que desculpo pela negligência com que tratou a educação das filhas, acima de tudo, pelo não acompanhamento e total desconhecimento de "quem são, realmente, as suas filhas", ele depositou toda essa tarefa nas mãos da instrução formal. Maria e Julia tiveram professores - no início de O Parque de Mansfield, elas gabam-se e gozam com a prima Fanny por ela não saber localizar determinado país no mapa, pois nunca teve Geografia - mas faltou-lhes algo essencial: uma base de principios, valore, no fundo, uma educação moral e de consciência.

 

Julia vive na sombra da irmã, igualmente mimada, tem várias alturas de amuos e birras - lembro-me da cena do Lovers Vows onde ela não consegue o papel desejado e por isso desiste. Maria e Julia estão, durante um período do enredo, em permanente disputa, tudo por causa de Mr. Crawford. Julia acaba por desistir - talvez por isso Jane Austen não seja tão dura com ela e lhe dê uma segunda oportunidade no fim do romance. Porque é que vocês acham que Austen não penaliza tão gravemente Julia?

 

Introdução aos Estudo Crítico de Jane Austen

Trouxe da biblioteca da minha universidade este livro: Introdução ao Estudo Crítico de Jane Austen, Álvaro Pina. Não foi uma leitura fácil, o autor, Professor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, tem uma escrita própria para estudantes/investigadores desta área, ora, eu, sem qualquer preparação a este nível, tive algumas dificuldades, até porque não estou dentro do tema - sou apenas uma leitora de tempos livres da obra de Jane Austen. No entanto, gostava de partilhar algumas ideias e, nesse sentido, vou colocar aqui pequenos trechos da publicação.

 

"(...) e Jane Austen, que nunca sentiu a necessidade de se libertar da estreiteza da sua cultura - que ela vivia e pensava predominantemente como convívio social -, que sempre se abriu aos membros da sua família e às pessoas com quem conviveu e se relacionou na aceitação de um código de normas sociais que dignificam a inteligência, a educação e o bom gosto dos mais bem formados moralmente, realizou um importante exame de consciência ao estilo de vida, e aos valores que o norteavam, de finais do séc. XVIII (...) e às suas possibilidades humanas. (...)

 

Mas Jane Austen, herdeira da cultura setecentista, foi capaz de dramatizar o estilo de vida de uma classe cuja educação é espelho e prova das preocupações morais dessa cultura, reveladas na relação complexa da personagem principal com as figuras secundárias e com a narradora, disciplinou experiências narrativas anteriores, libertando-as da convenção epistolar, por um lado, e da "largueza de espírito" que é indiferença moral ou mediocridade humana, por outro; (...) Jane Austen ensinou o que é um romance relevante como obra de arte e como exame de consciência de uma classe e de uma cultura realizado em inteligente maturidade de apreciação (...)

 

Os romancistas, homens e mulheres, do séc. XVIII valem apenas em Jane Austen, que com eles aprendeu a contar melhor do que eles jamais souberam (...) Olhando para Jane Austen (...) a sua criação pode definir-se em termos de inovação e de renovação: de inovação, porque encontrou o romance como forma de entretenimento, menor, irrelevante, simples processo narrativo com um propósito para o qual é subsidiário, e fez dele um poema dramático; de renovação, porque trouxe, pelo romance, à literatura inglesa a qualidade Shakesperiana de profunda relevância para a vida em criações de experiências humanas em que a vida é respeitada em complexidade (...) e em maturidade, sem ser subordinada a uma pregação ou propaganda (...)

 

A sua (Jane Austen) grandeza é esta: ter criado o romance inglês moderno, ter sido a sua inteligência moral criadora de arte narrativa a fonte exemplar de que todos os grandes romancistas beberam a verdade do romance como forma superior de literatura e de vida. (...) Não me impedem de caracterizar os romances de Jane Austen nas suas novidades absolutas: a complexidade da personagem principal, a actuação irónica da narradora e o enredo dramatizado. (...)

 

O enredo Austeniano é assumido como consciência de um estilo de vida, adensado num drama de valores e resolvido em comédia. A resolução em comédia não significa nem uma simplificação de problemas nem uma cegueira para os conflitos das personagens; (...) o leitor pressente que as personagens não são forçadas a suportar os conflitos até aos seus limites humanos, e por isso podem ser felizes; a comédia de Jane Austen é um dado do optimismo radical da cultura setecentista, um elemento de verdade na sua obra. Por ela sabemos da verdade dos conflitos - e por nunca estarem ausentes os perigos de infelicidade ou de tragédia pessoal numa opção irreversível - e da sinceridade das protagonistas que os vivem e sofrem, e que têm a fortuna de sair vitoriosas deles porque a inteligência humana pode triunfar sobre todos os dilemas. (...)"