DESAFIO | Bicentenário "Sense and Sensibility" #38
- Sense and Sensibility em Portugal 200 anos depois – I Parte - #2
- O tradutor visto por uma leiga -
Como eu afirmei no post anterior, não sou tradutora e estou bem longe disto. Contudo, a dada altura e durante a leitura comparada, comecei a reflectir sobre a posição do tradutor. Neste desafio não estamos a focar o olhar unicamente sobre Jane Austen, mas sobretudo sobre as opções tomadas por cada tradutor.
Dei por mim a pensar na dinâmica deste trabalho e surgiu-me este pensamento: haverá condição mais solitária do que o tradutor no exercício do seu ofício? Não sei se a minha interrogação será abusiva mas comecei a visualizar mentalmente o tradutor neste diálogo silencioso de leitura e de descodificação de uma mensagem. Ele está diante de uma obra, que pertence a um tempo histórico, a uma cultura, a um tipo de mentalidade e a uma língua específica. Para além disso, ainda temos que considerar que há o escritor e a sua intencionalidade. E, ainda temos de considerar também, que o tradutor tem o seu ponto de vista de leitor e que tem de abstrair-se disto. Ou não?
Interrogo-me, muitas vezes, se a dualidade “tradutor/leitor” entram em conflito na actividade de tradução. Há a intenção do autor da obra que, excepto ele a deixe por escrito, nunca a alcançamos totalmente. Há a interpretação da obra por parte do leitor. Isto será um terreno minado para quem tem a tarefa de traduzir uma obra?
Parto da ideia de que para efectuar qualquer tradução estarão inerentes determinados processos que levam ao rigor e a objectividade para obter um resultado final fiel ao original. Num texto técnico, o rigor e a objectividade parecem-me ser metas indispensáveis senão fundamentais. Num texto e obra de cariz literário, para além disto, há toda uma série de condicionalismos. Alguns condicionalismos foram referidos acima: tempo histórico, cultura, língua, mentalidade; mas ainda há outros, dentre eles: o estilo de escrita do autor da obra, a coordenação entre a subjectividade do autor e do tradutor, e a interpretação da intencionalidade do autor pelo tradutor. Será que podemos conceber que exista este espaço de interpretação? Isto é, a semelhança de um jornalista, há a necessidade de imparcialidade como condição ética essencial para o exercício da sua actividade; ou, pelo contrário, a parcialidade é benéfica?
Estas interrogações e afirmações têm uma natureza intuitiva. Foram ilações que me atravessavam a mente durante o exercício de leitura de ambas as traduções. Não quero ter a pretensão de lançar pressupostos sobre a técnica de tradução ou sobre o trabalho do tradutor e acredito que estas questões poderão parecer “romantização” da profissão. A minha partilha destina-se, apenas, a ser matéria de reflexão de uma actividade que parece ficar um pouco à sombra do anonimato.