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Jane Austen Portugal

O Blogue de Portugal dedicado à Escritora

Shortstory – parte 52

Fanny sentia que todos estavam suspensos pelas suas palavras e pelo que delas poderia resultar. E assim respirou fundo e começou a relatar como havia chegado até aos penhascos e à propriedade que só mais tarde soube que se chamava BlackThunder, angustiada pelos seus próprios receios porque se sentia perdida e tudo era assustador e gigantesco.

 

- Não havia ali vivalma – contou ela – Desci do cavalo e percorri a mansão de um lado ao outro, parecia estar desabitada e sem sinais de qualquer tipo de ocupação… mas quando ia já desistir de encontrar alguém, ouvi um ruído… no rés do chão havia uma janela entreaberta, uma fresta, pareceu-me ouvir um gemido…

 

Anne suspirou. Todas aquelas memórias lhe eram muito dolorosas ainda. Mas tinha de ser, tudo tinha de ser contado agora para não voltar a pensar mais nisso. E agora tinha Wentworth e todos sabiam, esse era um grande consolo e uma enorme alegria. Anne tinha-se arrependido tanto por não ter contado sobre Wentworth a toda a gente, por não ter falado acerca do que se passava antes de ter acontecido o rapto! Mas o seu temperamento, por norma tão tímido, após toda uma vida a pensar primeiro nos outros e só depois em si própria, tudo isso tinha possibilitado a situação vivida.

 

- Não tinham um caseiro em BlackThunder? – perguntou então Darcy, interrompendo-lhe os pensamentos.

 

- Não conseguimos localizá-lo até agora – respondeu Coronel Tilney – Dá a impressão que se eclipsou mesmo antes de o rapto ter sido realizado.

 

- Nunca dei conta de lá estar outra pessoa que não fosse… - sussurrou Anne – que não fosse aquele maldito primo.

 

- Depois foi tudo muito rápido – continuou Fanny, desejosa de se desenvencilhar dos pormenores – consegui chegar à janela entreaberta, através da qual estava Anne em condições deploráveis, amarrada, com uma mordaça meio colocada no rosto…

 

- E foi para mim um sonho quando a vi – confessou Anne – eu até duvidava que fosse verdade, parecia mais um sonho no meio de um pesadelo tão tremendo…

 

- Não consegui entrar pela janela porque estava perra e eu não tinha forças suficientes para a abrir – disse Fanny – Enquanto isso, Anne debatia-se e tentava comunicar comigo, porque a mordaça estava quase solta e era possível entender algumas palavras…

 

- Contei-lhe o que pude, falei em Elliot que me retinha ali contra a minha vontade, que ele devia estar quase a chegar – disse Anne – e pedi que fosse procurar ajuda. Tinha receio que ele chegasse e a encontrasse. Era capaz de a prender ali também…

 

- No meio de todas os receios que tive – disse Fanny – conseguir ter lucidez para agarrar numa pedra e partir os vidros da janela. Empurrei-a ainda mais e começou a ceder… parecia estar podre. E foi assim que consegui entrar naquela divisão onde estava Anne e a ajudei a libertar como pude…

 

Os outros contemplaram-na com admiração e respeito. A pequena Fanny fora capaz de um feito tão imenso, tão grande…

 

- Quando Fanny me libertou, sentia-me toda ferida e dolorida das cordas que me haviam aprisionado os braços e as pernas mas estava ansiosa para que dali saíssemos, porque tinha receio que ele chegasse e nos apanhasse ali…

 

- Então ajudei Anne a sair – contou Fanny – A minha ideia era montarmos ambas no cavalo e seguirmos para qualquer lado, para fora dali… mas a maré estava a subir, eu não sabia que aquele lugar era completamente cercado pelo mar quando subia a maré… foi horrível, Anne sem forças e eu trémula e fraca…

 

- Mas ao ver como lentamente a maré subia, enchendo devagar os espaços que antes eram caminhos, uma força enorme percorreu-me – contou Anne – e eu consegui montar, quase sem a ajuda de Fanny…

 

- E ambas nos dispusemos a galope, a galope, pelo caminho que se enchia de água – disse Fanny. – Eu estava perdida, mas avancei para sair dali e salvar Anne que não parava de me dizer que o primo ia voltar e que nos haveria de fazer mal… foi então que me lembrei da distância a que estávamos de Pemberley. Se eu deixasse Anne perto de Pemberley e seguisse para comunicar o acontecido para KellynchHall para procurar ajuda e comunicar a todos o que se passava seria a melhor opção… mas eu estava perdida, fora por isso que chegara aos penhascos e encontrara Anne…

 

- Após todas estas vicissitudes, demos com o caminho – contou Anne – e encontrámos a entrada de Pemberley ao fim de um bom par de horas. Fanny disse que a partir dali talvez se conseguisse orientar, que ia tentar e deixou-me aqui. Foi quando me viram, eu estava a desmaiar…

- Quando deixei Anne, não supunha que estivesse tão mal – confessou Fanny – O que eu queria era chegar quanto antes a KellynchHall para contar tudo a Wentworth e ao Almirante Croft. Julguei que aqui Anne estava em boas mãos, já liberta dos perigos que a ameaçavam…

- E pensaste muito bem, minha querida Fanny – considerou Georgiana.

 

Todos respiraram fundo. Era um alívio que tudo já tivesse passado e as duas jovens tivessem conseguido sair daquele casarão sãs e salvas! Nem se atreviam a imaginar o que poderia ter sucedido se as coisas tivessem corrido mal.

 

- Minha filha – declarou Lady Russell – como já disse ontem, sinto-me tão arrependida pela confiança que depositei naquele malfadado Elliot! Tenho tanta pena de atitudes que tomei, levada pelas minhas crenças e preconceitos! – e o seu olhar cruzou-se com o de General Tilney.

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